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O valor de revisitar conteúdos já conhecidos

Minha mãe nunca foi muito de ver televisão. Ela assiste novelas e programas de fofoca como todo brasileiro médio faz (mesmo que escondido), mas nada muito além disso. Por isso, fiquei bastante surpreso quando, há uns dois anos, ela me pediu para usar minha conta da Netflix (que eu também não uso, pra ser sincero). Ela queria assistir “Grey’s Anatomy”, por recomendação de algumas amigas.

Quinze temporadas depois, me pego perguntando o que será que ela assistirá em seguida. Afinal, ela tinha criado um hábito de sempre sentar para assistir seu seriado durante a noite. Cheguei a pensar em algumas recomendações, caso ela viesse perguntar por elas, mas a conversa que tive foi inesperada: “Vou reassistir tudo do começo”.

Introdução feita, vamos falar sobre o tema da postagem: Qual o valor de revisitar obras que você já consumiu? Qual o balanço ideal entre consumir novas coisas e buscar de novo aquilo que já foi consumido? Esse é um assunto relevante o bastante para se discutir?

Vou começar respondendo a terceira pergunta: Não, não é. Não acho que precisamos discutir ou criar conversas elaboradas sobre o assunto. Afinal, acaba sendo uma coisa pessoal e de opinião, certo? Isso sim é questão de opinião. Minha mãe não está fazendo mal a ninguém por reassistir Grey’s Anatomy inteiro pela quinta vez (sim, pois é). Então… tudo bem? Se ela prefere assistir a mesma coisa de novo ao invés de conhecer novas séries, pra quê discutir?

Então é isso. Acabou a postagem. Valeu galera, e até a próxima.

Foto de Patrick Dempsey, no papel de "Derek Shepherd", em "Grey's Anatomy"
E foi aí que o problema começou… Aquele sorriso… Aquele maldito sorriso…

Ok, ok. De verdade, acredito que a questão principal é que existem dois grupos bem distintos de pessoas, e elas não costumam entender o outro lado. As pessoas que preferem conteúdo novo não entendem a motivação das pessoas que gostam de revisitar conteúdo já conhecido, e vice-versa.

Como uma pessoa que era membro fanático dos exclusivetes, mas que está começando a virar a casaca, acredito que posso falar pelos dois lados.

Seja lá qual a mídia que você gosta de consumir, pode ter certeza que existe o suficiente para que você possa ficar o resto de sua vida sem precisar repetir uma única vez. Séries? Mais de mil delas, só na Netflix; Filmes? Provavelmente mais de cem mil já foram produzidos; Quadrinhos? Só na sua estante você deve ter uns trinta que não foram lidos ainda; Animes? Só a Crunchyroll oferece mais de 700 títulos no Brasil; Livros? São escritos há literalmente milhares de anos.

Com catálogos tão grandes, e tantas experiências novas podendo ser descobertas, muitas pessoas acabam tendo dificuldade em se imaginar “perdendo tempo” ao rever um filme ou reler um quadrinho que já conhecem. Quem sabe esse livro não é aquele que se tornará o meu novo favorito? Não saberei até terminar de lê-lo!

Por outro lado… Só existe um único favorito. Sempre haverá apenas um “melhor”. Isso significa que todos os outros não serão tão bons assim. As chances dessa coisa nova ser pior do que eu imagino são bem maiores do que a de ser algo melhor do que eu espero, não é? Mais vale ter certeza de que aquilo que estou consumindo é, de fato, bom. Assim, eu maximizo o meu tempo!

Mas, quando temos uma infinidade de possibilidades disponíveis, parece um pouco presunçoso pensar que você já encontrou sua alma gêmea. Claro que você pode ter gostado muito desse livro, mas achar logo de cara que ele é a maior invenção da humanidade desde o filtro de barro é forçar um pouco a barra. Que tal analisar aquilo que você gostou, e tentar entender o motivo de ter gostado daquilo? Você pode acabar encontrando alguns gêneros ou tipos de histórias que te agradam, e pode buscar isso em novas obras.

Dois exemplos disso, um que deu certo, e outro que não deu: Voltamos pra minha mãe. Ela adorou Grey’s Anatomy. Assim, recomendei que procurasse outras séries médicas. Ela assistiu “The Good Doctor: O Bom Doutor” na Globo Play, e o resultado? Ela não gostou. No final das contas, o que fez com que ela gostasse de Grey’s Anatomy não era o fato de ser uma série médica. Logo depois, ela começou a assistir “Lucifer”, na Netflix, e adorou o novo passatempo. Conclusão? Descobrimos que ela está mais interessada em romances no ambiente de trabalho do que em hospitais. E agora, ela tem exorbitantes DOIS seriados que ela gosta de assistir!

Foto de "Tom Ellis" no papel de "Lucifer"
Espere aí… talvez eu esteja começando a notar um padrão nos seriados que minha mãe gosta…

Além disso, tem aquele ditado lá né? “Nunca se banha duas vezes no mesmo rio”. Acho um péssimo ditado pois ele é um dos poucos ditados que requer corolário. Ele diz isso pois na segunda vez, tanto o rio como você já estão mudados, fazendo com que “outra pessoa” esteja se banhando em “outro rio”… Enfim. No contexto, o que quero trazer é que com o passar do tempo, com o ganho de novas experiências e de novas perspectivas, é possível que sua visão de uma obra mude.

Recentemente, tivemos a terceira e última temporada de “My Teen Romantic Comedy SNAFU” (Show que está disponível no Brasil na Crunchyroll e que eu comentei numa postagem). O animê estreou em 2013 e teve sua segunda temporada em 2015, e portanto, julguei mais sábio reassistir tudo antes de embarcar na última jornada. A série é um drama adolescente surpreendentemente realista, e isso é um ponto importante. Em 2013, eu ainda era um adolescente, e estava no segundo ano do ensino médio (mesmo ano que todas as personagens do show, inclusive). Um adolescente assistindo um drama adolescente é uma experiência absurdamente diferente de um adulto (supostamente) assistindo um drama adolescente. Eu revi o show e parecia que eu estava vendo uma coisa completamente nova. Minha visão sobre tudo mudou de uma forma drástica.

Foi uma mudança tão grande que me animou a dar uma nova chance para coisas que eu já tinha visto. “Será que meus favoritos ainda são tão bons quanto eu me lembro?” eu meu questionei. Pretendo rever “Angel Beats” em breve, para descobrir.

Imagem do tema de encerramento de "Angel Beats"
Algumas coisas, porém, o tempo não muda. Essa imagem ainda me dá um baque, dez anos depois…

O que tiramos disso tudo é que, sinceramente? Faça o que lhe deixar mais feliz. Às vezes, você simplesmente não está com saco para experimentar coisas novas, e quer o conforto de sentar no seu sofá e ler o mesmo gibi do Batman pela quadragésima vez, pois você sabe que aquele socão que ele dá na página 37 é muito satisfatório. E às vezes, você não aguenta mais assistir Quarteto Fantástico e o Surfista Prateado, que parece passar sete vezes ao dia na TV fechada, e clica em algo aleatório na Netflix. Dê uma chance para ambos.

Por Vini Leonardi

Cavaquinho na roda de pagode da Torre. Químico de formação, blogueirinho por diversão e piadista de vocação. "Acredito que animês são a mídia perfeita para a comédia, e qualquer tentativa de fazer um show sério é um sacrilégio", respondeu ao ser questionado sobre o motivo de nunca ter visto Evangelion.