Categorias
Quadrinhos

O horror tem cor | O Despertar do Cthulhu em Quadrinhos

“O Desespero é verde

Aqui na Torre de Vigilância você já sabe que será publicada pela Editora Panini a HQ Providence de Alan Moore, baseada no universo de terror de H.P. Lovecraft. Bem, se ainda não sabe, veja a matéria AQUI. O que muitas pessoas ainda não sabem que os quadrinhos de terror já estão sendo publicados no Brasil há algum tempo.

A Editora Draco vem fazendo um excelente trabalho nessa área. Ela publicou as coletâneas O Rei Amarelo em Quadrinhos (veja mais detalhes AQUI) e o Despertar do Cthulhu em Quadrinhos (2016), duas antologias de terror que se diferenciam principalmente pelo tom de cores, respectivamente, amarelo e verde. O Rei Amarelo vem da obra de Robert W. Chambers, e o Cthulhu é do rico e vasto universo de Lovecraft,.

Criado por H.P. Lovecraft em 1926, Cthulhu fez a sua primeira aparição no conto O Chamado de Cthulhu (The Call of Cthulhu) e é considerado como o grande mito do autor. O monstro esverdeado cheio de tentáculos é um deus que possui um culto multimilenar dedicado a trazê-lo de volta, o que pode provocar o fim da humanidade.

O álbum publicado pela Draco contém oito histórias produzidas por autores e desenhistas brasileiros, todas elas interpretam à sua maneira algum assunto relacionado ao Mito de Cthulhu. O mais bacana é a produção, muito bem feita da edição,  com uma qualidade incrível. Obviamente, um conto se destaca mais do que o outro, mas todos estão em um nível muito acima de outras coletâneas de terror.

Conheça um pouco sobre as histórias do volume (em ordem de leitura):

O Salmo do Sangue Antigo

Produzida por Dudu Torres, a história fala de um rapaz que visita a mãe de um antigo amigo, que acabara de cometer suicídio. A velha senhora acaba levando o rapaz para uma outra realidade, onde acontece toda a ação.


Os Tambores de Azathoth

A segunda história se passa durante a Segunda Guerra Mundial e contém figuras históricas como Oppenheimer (um dos criadores da bomba atômica) e o mago ocultista Aleister Crowley, que é citado nas músicas de Raul Seixas. Existe uma lenda que conta que Lovecraft e Crowley tinham uma certa conexão. O roteiro é de Antonio Tadeu e a arte é Lucas Chewie.


Macio

O conto escrito por Airton Marinho se ambienta em uma pequena cidade no sertão do Brasil. Uma epidemia toma conta do local, e as pessoas sem saber o que fazer vão enlouquecendo. Os desenhos de Fabrício Bohrer são traços bem grossos, onde se destaca a flexibilidade dos quadros graças às onomatopeias fora do comum. O Bode Pai-de-Chiqueiro é um dos personagens principais, que tem o papel de por onde passar disseminar o caos. Pessoas explodindo, corpos em decomposição, moscas e vermes dão um toque de gore à brasileira na história.


Sob a Insana Luz

É uma das que mais se aproximam ao estilo de H.P. Lovecraft. Com roteiro de Caiuã Araújo e desenho de Marcio de Castro, a história fala sobre dois detetives que chegam a uma tranquila cidade para investigarem o desaparecimento de uma equipe investigativa. Mas acontece que a cidade não aparenta o que é de verdade. Um dos grandes destaques é a arte do Marcio, algo meio que cartunesco e rabiscado, seus personagens parecem que saltaram de uma animação de argila e os efeitos de sombra e luz dão à história um clima incrível. E tem uma referência ao Batman no nome do hotel da cidade.


Clhithmaek’ Tyivh

Bem, para começar, não me perguntem como se pronuncia esse título. Escrito e desenhado por Lucas Pereira, a história mostra uma dupla de arqueólogos que acabam encontrando uma tribo desconhecida. As coisas começam a ficar complicadas quando os nativos fazem um ritual sinistro para invocar uma criatura antiga. É o conto que tem o estilo mais americanizado de todo o volume. O clima é tenso durante as páginas e cenas de pessoas empaladas e canibalismo se encontram nos quadros com poucas cores. Os tons de verde e cinza predominam.


A Língua da Fé

Tendo sua vida como um fracasso total, um alcoólatra procura em uma religião, dessas que são presentes na TV e manipulam seus fiéis, um porto seguro para estancar a sua agonia e tristeza. O problema é que nada é o que parece ser quando ele começa a descobrir mais sobre o culto. O roteiro é de Raphael Fernandes, organizador da coletânea e editor da Draco e a arte é de Samuel Bono. Com um climão de suspense, a história coloca para o leitor diversos questionamentos sobre essas religiões. O verde em muitas texturas diferentes é o grande destaque dos desenhos.


O Caso da Truta Salmonada

Cansado de sua rotina de trabalho, um sushiman se prepara para começar mais um dia, quando alguns esquisitos clientes com o rosto de peixe entram em seu restaurante. Enquanto ele prepara os pratos, cortando os filés, eles começam a gritar de dor como se fossem eles sendo mutilados. Estranho é pouco. Jun Sugiyama nos apresenta um conto aterrorizante, grotesco e perturbador. Os quadros de agonia e dor dos “humanos-com-cara-de-peixe” são bizarros. É um dos melhores contos da edição. E o final tem uma surpresa.


O Que Dorme

A história de Bárbara Garcia fecha a edição levando o leitor para uma cidade que passa por uma estranha epidemia onde nenhum cidadão não consegue mais dormir. O que deixa as pessoas cansadas sem conseguirem fazer nada. Então à medida de que as pessoas vão morrendo, os corpos vão ficando em decomposição nas ruas e casas onde ocorrem o mortes. Quando ninguém tem força nem para enterrar os mortos,  a loucura e o que há de ruim dentro das pessoas começa a aflorar. A linda arte de Elias Aquino demonstra bem essa loucura e ao mesmo tempo o clima pacato e cotidiano dessa população.


A Editora Draco caprichou em O Despertar de Cthulhu com um álbum muito bem produzido e bonito, essencial aos fãs do gênero de terror quanto para quem curte ler quadrinhos de qualidade. E o mais legal é ver artistas brasileiros fazendo histórias de qualidade incrível, não devendo nada para muitas produções de terror lá de fora. A capa é de autoria de João Pirolla e traz a retratação mais clássica de Cthulhu. Vale muito a pena o investimento em uma obra tão bacana.

O Despertar do Cthulhu em Quadrinhos tem formato 17 cm X 24 cm, papel couché, 168 páginas em preto, branco e verde, o acabamento em capa cartonada, com orelhas e reserva em verniz. Dentro ainda tem uma pequena biografia de todos que participaram da edição. Edição indispensável para qualquer colecionador de quadrinhos.

 

 

Por Ricardo Ramos

Gibizeiro, escritor, jogador de games, cervejeiro, rockêro e pai da Melissa.

Contatos, sugestões, dicas, idéias e xingamentos: ricardo@torredevigilancia.com