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Bingo: O Rei das Manhãs demonstra a força do cinema brasileiro

O cinema brasileiro está fragmentado em dois extremos nesse ano, com poucas exceções. Ou o filme apresenta um humor escrachado com situações absurdas, ou foca na discussão sobre o cenário político, que está bem turbulento atualmente. Já Bingo: O Rei das Manhãs, é uma das exceções que coloca em tela técnica e qualidade cinematográfica, fugindo do clichê nacional e aplicando otimismo no mercado da sétima arte no Brasil.

Inspirado na história de Arlindo Barreto, um dos intérpretes do Bozo, Bingo detalha todas as particularidades de sua vida profissional com muito charme e competência. Porém, o filme deixa claro que sua história é apenas uma inspiração, e não está com objetivos de construir uma cinebiografia. Não houve um charme em sua vida, mas neste filme, o glamour está presente em todas as camadas preparadas por Daniel Rezende, experiente montador em sua primeira empreitada como diretor de longa-metragem.

Rezende é um renomado montador brasileiro. Trabalhou nos filmes Tropa de Elite (2007), Tropa de Elite 2 (2010) e até o famoso Cidade de Deus (2002) . Sua colaboração como montador no Brasil foi deixada de lado para ele tomar o posto de diretor… e que baita diretor! É na direção que está o coração do Rei das Manhãs. Começando pela construção dos personagens, o diretor busca imagens, composições de cores e luzes para criar uma identificação própria com os atores/atrizes. A predominância das cores quentes, principalmente, transmitem a intensidade do psicológico perturbado do protagonista Augusto (Vladimir Brichta) e cria um ambiente intenso e às vezes melancólico.

Há também a preocupação em retratar a época em que a história está inserida: os anos 80. Os mais velhos devem sentir uma dose nostálgica e os mais novos devem começar a entender mais a cultura artística e de entretenimento do país. Até os jovens que assistem TV devem se surpreender em algumas cenas. Figurino, contextualização, trilha sonora e cenários trazem os anos 80 de uma forma natural, um grande feito entre as produções brasileiras.

Como montador, é perceptível o equilíbrio que o trabalho do Daniel Rezende traz como bagagem. Entender como se constrói uma narrativa faz toda a diferença. As várias camadas contém extremos como humor e drama, sucesso e fracasso, além de reconhecimento e esquecimento. Todos esses momentos são encaixados como peças de uma base que irá sustentar o conflito interno de Bingo.

O clímax de Bingo: O Reis das Manhãs se resume ao conflito do protagonista. A busca faminta e ao mesmo tempo suja e obscura pelo reconhecimento e o estrelato, toma o espectador como um refém da situação, que reconhece a escuridão que assola o mundo do entretenimento. Até onde uma pessoa iria para conquistar o sucesso e os holofotes? E essa questão vai sendo desenvolvida ao longo do filme e ganhando maturidade pela a atuação de Vladimir Brichta.

Brichta é o curioso caso de envolvimento entre ator e personagem. Cada passo e evolução do protagonista, o próprio ator se engrandece. A sua atuação é tão fragmentada como a própria montagem. Seu sarcasmo somado à sua frustração, criam uma angústia dentro de si, consequentemente, Vladimir Britcha personifica Augusto e Bingo, que se tornam uma mente própria e hipnotizam pela naturalidade de ambos.  O ator participou de algumas novelas e séries, além de filmes focados na comédia, mas este parece ser o ponto alto da carreira.

Outras participações merecem ser mencionadas. Leandra Leal continua atuando como a profissional que é. Como Brichta, Leal se molda em sua personagem Lucia, diretora do programa infantil. Há aparições pontuais como a de Pedro Bial, Tainá Müller, o falecido Domingos Montagner, Augusto Madeira e Emanuelle Araújo como Gretchen. Ana Lúcia Torre é uma das mais experientes do elenco, sua interpretação é estonteante como mãe de Augusto, que tem as mesmas ambições do filho.

Ao todo, o resultado se mostra satisfatório e nos deixa perplexos pela vida de Arlindo Barreto e pela estrada podre ao reconhecimento exagerado. Como troféus e  holofotes não trazem a felicidade e a sensação gloriosa que fingem dar. Uma crítica profunda para a própria indústria televisiva e cinematográfica. Há mais de 30 anos atrás e as semelhanças espantam.

Bingo: O Rei das Manhãs é o resultado do trabalho nacional. O projeto de Daniel Rezende e Vladimir Brichta se mostra um grande concorrente ao Oscar pelo Brasil, mas, primeiramente, que deve ser prestigiado pelo próprio brasileiro por seu significado e importância. Uma estatueta não substituí isso.

Por Thiago Pinto

‘’E quando acabar de ler a matéria, terá minha permissão para sair’’

-Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge (2012)