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Buscando…: A sombria realidade falsa

Buscando… consiste em um trabalho pensado profundamente, que se sustenta no suspense para transformar sua narrativa em uma verdadeira experimentação. Gerando um conflito entrelaçado com seus personagens e relacionamentos, o filme consegue demonstrar a dramaticidade e urgência de sua história, mas sem ignorar a autenticidade da linguagem cinematográfica adotada. A internet e os meios eletrônicos como base para toda a construção da narrativa trazem identidade a obra, que discute polêmicas e problemáticas envolvendo os espectadores numa progressiva descoberta ligada ao enredo e à nossa própria realidade.

Nos primeiros minutos de exibição, há dois elementos fundamentais estabelecidos: o psicológico dos personagens e a linguagem. Através da tela de um computador – que será o cenário até o final – nos é transmitido o passado da família Kim até os dias de hoje. Os registros dos familiares ficam contidos nos incontáveis documentos no computador. Através de fotos, vídeos, telefonemas e notificações, conseguimos entender os acontecimentos de forma cronológica e coerente. Mesmo sendo previsível o que acontecerá com uma das personagens, o diretor Aneesh Chaganty encontra maneiras inventivas e criativas de revelar os desfechos. A partir deste início, a conexão com o filme está realizada, e a linguagem estabelecida.

O mistério é transmitido ao redor do desaparecimento da filha (Margot Kim) e a tentativa desesperado do pai (David Kim) de reencontra-la. Com isso, ele começa uma busca incansável nas redes sociais da garota, tomando conhecimento de outras dificuldades enfrentadas e escondidas por sua filha. As descobertas do pai são empolgantes, já que estão inseridas no conceito da linguagem do computador acompanhado de uma trilha tensa – intensificando a dramaticidade e a perturbação. Porém, a melhor de todas adaptações decorrentes da técnica de produção é a utilização da webcam como ponto de vista. Os planos e enquadramentos são fixos e inexpressivos, abrindo total espaço para atuação dos personagens – por outro lado, os planos do Windows e do MacBook são intercalados para se criar dinamismo na hora do suspense, incluindo cortes secos e zoom.

Bem montado e estruturalmente sem falhas, Buscando… consegue implementar um discurso rígido e sério sobre a utilização da tecnologia nos dias atuais. Contudo, nada é nu e cru. O trabalho é fragmentado pelas questões de justiça cibernética, exclusão social, pós-verdade e até julgamento público. Tais problemáticas não são abordadas de forma direta, sendo diluídas através das cenas no clímax do suspense. E, consequentemente, o filme nos coloca na posição de julgarmos as ações dos personagens, decorrentes das descobertas ao longo da exibição.

Mesmo assim, o thriller mostra que as suspeitas estavam equivocadas, nos colocando contra a parede. Neste momento, percebemos que nos tornamos logo aquilo que Buscando… estava criticando. A obra  deixa de ser um mero suspense para dar espaço a um experimento social válido e complexo, demonstrando que as influências da tecnologia são um ciclo interminável. Os pensamentos e os julgamentos estão em nossas cabeças, só basta um meio de alcance considerável para expô-los. Não importando quem esteja do outro lado da tela.

O terceiro ato é constituído por dois plot twists coerentes com o que foi contado. Existem, obviamente, algumas extrapoladas inevitáveis para concretizar o destino dos personagens, mas aceitáveis na presença de uma ótima construção e ambientação. Imitando o começo, o final combina os elementos cinematográficos na transmissão de uma conclusão em nível de excelência.

Buscando… é o tipo do gênero de suspense que consegue captar o público de primeira e desenvolver satisfatoriamente sua história. Entretanto, o principal atrativo fica com o experimento feito simultaneamente, que nos demonstra a incapacidade do ser humano diante da nova realidade dominada pela tecnologia, falsa e obscura.

Por Thiago Pinto

‘’E quando acabar de ler a matéria, terá minha permissão para sair’’

-Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge (2012)