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A experiência incrível, insólita e única em Mundo Pet de Lourenço Mutarelli

Para começar a falar de Mundo Pet é necessário saber o que não se trata apenas de uma coletânea de histórias. E sim são fragmentos de uma viagem insólita que mescla utopia, aversão as coisas tradicionais, mistério e um tanto de autobiografia de seu autor Lourenço Mutarelli. Aliás, peço aqui permissão para poder falar de Mutarelli, essa é minha primeira resenha sobre o escritor e penso que ainda preciso conhecer muito mais para poder falar sobre. Mas no bom clichê de toda resenha, nesse momento eu preciso escrever: “vamos lá!”.

E o temível clichê é muito presente nessas histórias. Mas não como uma falta de ousadia e inventividade do autor, mas porque ele deve estar ali mesmo. Como um personagem. Assim como a repulsa, o medo, a satisfação, a inocência, a alegria, o choro. Como a vida e a morte. Todos esses elementos e um pouco mais estão presentes em Mundo Pet. Um mundo criado por Mutarelli em cima de experiências próprias e que bizarramente em algum momento você reconhece alguma dessa experiência. Que pode ter acontecido com algum conhecido ou até mesmo com você.

Ler Mundo Pet é um exercício fora da caixinha. Não é como ler os quadrinhos que estamos acostumados a ler normalmente. E nem estou falando dos imbecis tradicionais super-heróis. Hoje o leitor brasileiro tem uma gama de diferentes formas de leitura, não tem a necessidade de ficar datado a Marvel/DC e suas tradicionais ideologias e modos de contar histórias. E para ler Mundo Pet você tem que abraçar o mundo que não está acostumado a ler, assistir e viver. Mas que está presente em todo momento em todos os lugares. Só insistimos ignorar com nossa presunção e arrogância.

Quando você abraça a leitura de Mundo Pet, que confesso pode ser difícil pela ausência de similaridades que muitos não tem ou não estão acostumados a ter, um novo campo de visão te encontra, te abraça e te beija como um amante desconhecido. Um beijo que te leva para casos bizarros em que você não sabe se torce para o protagonista das histórias se darem bem ou para simplesmente acontecer algo para terminar suas agonias. Como para Alfredo Consuelo em Crianças Desaparecidas ou para José Manoel Rotundo, vulgo Risadinha, em A Ninguém é Dado Alegar o Descobrimento da Lei.

Nesse misto de sentimentos existentes nas histórias de Mundo Pet, nos pegamos em sua arte diferente, bizarra e linda, nos espelhando em situações e casos. Lourenço Mutarelli escancara as portas da alma, revelando um sujeito fora dos padrões, sedimentado e esmagado por momentos irreversíveis da condição humana. Assim como em Kafka, a degradação humana se dá de maneira insólita, a partir de situações absurdas apresentadas como algo definitivo, incontornável e familiar.

Como em toda coletânea algumas histórias se destacam mais do que as outras. Mas em Mundo Pet, acredito que, a experiência de leitura de cada leitor faça que suas escolhas de histórias preferidas fique muito individual. Da minha parte eu destaco: Estampa Forjada, Meu Primeiro Amor, Dossiê Stick Note e a história que dá o nome a coletânea, Mundo Pet.

As histórias de Mundo Pet foram publicadas entre os anos de 1998 e 2000 originalmente para o site Cybercomix. Em 2004, a Devir Brasil chegou a publicar Mundo Pet. E agora ficou a cargo da editora Comix Zone, em um belo trabalho de resgate das obras em quadrinhos de Lourenço Mutarelli, que iniciou em Capa Preta (2019), trazer a experiência única de Mundo Pet para os leitores.

É uma experiência diferente, que raspa no fundo da alma e da sua mente. Mas é uma grande experiência. Grande e única.

 

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Vamos Salvar o Simbolismo do Superman! E isso é um trabalho para Calvin Ellis!!

Super-força? Visão de raio X? Sopro-congelante? Super-velocidade? Qual o melhor poder do Superman? Você pode enumerar poderes do maior super-herói de todos os tempos, ou melhor, o super-herói definitivo. O Superman é o personagem que sempre será visado, em visões diferentes, versões diferentes e de formas diferentes. Mas as melhores versões do Superman (e acredite tem muitas versões) são aquelas que o maior poder do personagem é melhor executado e utilizado: o simbolismo.

O Superman é um símbolo. E quando qualquer escritor usa esse poder especial que poucos heróis tem, possivelmente o Steve Rogers/Capitão América chega próximo, são as melhores fases e histórias do personagem. Quando pegamos o quadrinho Entre a Foice e o Martelo, que Mark Millar apresenta o Superman soviético, resolve se transformar em um símbolo e mudar toda trajetória daquele país. O simbolismo em que Grant Morrison apresenta em Grandes Astros, como é importante ser o Superman no mundo. Até mesmo o Superman do Frank Miller, em Cavaleiro das Trevas, é um símbolo. Mesmo que seja um símbolo da derrocada dos heróis, o maior e mais forte homem do mundo virou um fantoche do governo. São alguns dos exemplos.


Então entendemos que o Superman é um símbolo. E só isso responde a pergunta que está encravada no título desse artigo. Mas como isso pode funcionar nos cinemas? É só fazer o simples e convicto no estilo Pantera Negra. Com representatividade, com respeito, amor e sendo um símbolo para as pessoas. Não que o Pantera Negra não tenha sido, ou melhor, não seja. Mas estamos falando do maior super-herói de todos os tempos.

Criando uma comparação meio forçada até, é como colocar o Martin Luther King com todos esses poderes. É o símbolo que até então na grande mídia e até mesmo nos quadrinhos, nunca conversou com a raça negra. Apesar de existir o Superman da Terra-23, ele nunca teve tanta importância no Universo DC, aparecendo em sagas entre as Terras ou algo similar. Ninguém na DC Comics nunca usou Calvin Ellis para ser protagonista de algo grande e único. Calvin Ellis precisa deixar de ser esse personagem que simplesmente somente representa uma contraparte de outra Terra e ser utilizado no como o símbolo que o Superman sempre teve.

Em um mundo em que as diferenças sociais estão cada vez mais ativas, em que casos como George Floyd, ou então em casos de pessoas famosas cometendo falas ou atos racistas em programas de realitys shows, e mesmo assim essas pessoas ainda ficando em evidência e ganhando milhares de seguidores, ou as infindáveis injustiças sociais que ocorrem no dia a dia e que se tornaram “rotina”. Um personagem do peso e da importância do Superman ser negro é extremamente importante. É um símbolo que pode e deve ter um efeito fantástico sobre a sociedade. Para os dois lados, tanto para inspirar para o bem, para inspirar, como para os milhares de imbecis vomitarem seus preconceitos em seus teclados covardes e seus relinchos que nada passa de uma “lacração”.

O Superman sempre foi a figura do imigrante. Aquela pessoa que tenta se incluir em um mundo que não é seu, que não pediu para ficar, mas escolheu ficar lá e proteger aquele povo que ele adotou. E o super-herói que vive de escolhas, que com sua audição escuta milhares de quilômetros e todos os problemas em volta, e precisa estar em vários lugares e salvamentos em locais diferentes. O Superman precisa decidir, usando um exemplo “idiota”, se vai se dar o luxo de jantar ou salvar um trem caindo de uma ponte.

Algo como a população negra hoje em dia. Como a população nordestina. Como a população indígena. Como a comunidade LGBTQ+. Como muitas mulheres. Pessoas que precisam escolher entre andarem sozinhas, entrar em lojas sem serem desconfiadas, de ter o um aparelho telefônico mais moderno ou ficar em casa para não correr o risco de acontecer nenhum preconceito/agressão contra.

Em uma época em que desconstruir as características benevolentes e inspiradoras do Superman virou moda em diversas mídias, e simplesmente sucatear o personagem como um super-herói violento é sinônimo de vendas, poder colocar o personagem com o simbolismo como sua maior virtude, seria muito bem-vindo. Provavelmente a última vez que o simbolismo do personagem foi melhor utilizado foi na, excelente, Superman: Smashes the Klan de 2020.

Possivelmente, eu, Ricardo Ramos, não seja a melhor pessoa para escrever esse texto. E tenho minha consciência isso e nem é minha intenção tentar me colocar no lugar de ninguém, eu não tenho esse direito. Eu não sofro como as pessoas que citei sofrem no dia a dia, como uma rotina maldita que não escolheram. Mas eu tenho certeza de que o Superman negro, e seu simbolismo, seria de suma importância para o mundo de hoje. Espero que realmente a Warner saiba fazer isso acontecer.

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Requiem: a morte (e vida) do Surfista Prateado

De todas as histórias do Surfista Prateado, Requiem foi a que mais me emocionou. Talvez eu seja ligeiramente suspeita para falar, já que Norrin Radd é, e sempre foi, meu personagem favorito da Marvel. Mas o que torna essa graphic novel tão especial? A resposta é simples: aqui, não temos mais a inviolabilidade do até então “indestrutível” corpo do Sentinela das Estrelas; tendo seus dias de vida contados, adentramos completamente em sua alma, sentindo seus medos, tristezas, alegrias e emoções. Sendo publicada pela primeira vez em 2007, essa obra prima em forma de quadrinhos é escrita por Michael Straczynski e desenhada por Esad Ribic, contando com apenas 4 edições.

Diagnóstico

A história começa com Surfista refletindo sobre a existência – a própria e a do universo. A morte, constata, faz parte de um ciclo, e é justamente ela a responsável para que a vida possa existir.

Com o intuito de investigar uma condição ainda desconhecida, Norrin vai à Terra para se encontrar com Reed Richards, seu amigo de longa data, e a quem sabe que pode confiar até mesmo seus temores. Depois de dolorosos testes, temos o resultado: o Surfista Prateado está morrendo; o material que recobre e protege seu corpo das mais perigosas adversidades está se desgastando, e resta à Norrin cerca de um mês de vida.

Em uma lembrança de tempos muito distantes, vemos a origem do Sentinela das Estrelas; vemos a chegada do temido Galactus a Zenn-La, e a decisão que mudou para sempre a vida do personagem. Em troca da preservação de seu planeta, Norrin se oferece para ser arauto do Devorador de Mundos, procurando planetas para que seu mestre pudesse devorar e saciar sua fome. É nesse momento que Norrin vira o Surfista; nesse momento, Norrin perde suas memórias e sua consciência, sofrendo a metamorfose que seria a responsável pela destruição de incontáveis vidas em nome de seu mandante.

Porém, é na sua primeira vinda à Terra que a chama esquecida do antigo Norrin Radd se acende. Vendo a relutância e a voracidade com que os humanos lutam pela sua sobrevivência, o Surfista percebe o mal que irá fazer se permitir que Galactus devore o planeta. Unindo forças com o Quarteto Fantástico, consegue expulsar seu mestre da Terra, deixando finalmente de ser seu servo.

Tais lembranças, além da função de ambientar o leitor no cânone do personagem, servem principalmente para nos mostrar toda a angústia e arrependimento que cercam o Surfista. Requiem não é apenas uma história sobre a morte; é uma história de redenção, um conto reflexivo sobre erros e acertos, sobre guerra e paz, sobre encontrar a plenitude que por anos foi incansavelmente buscada. Depois dessa retrospectiva, vem a pergunta: o que Surfista irá fazer nesse tempo de vida que lhe resta?

Bom… ele irá viver.

Encontro com o Homem-Aranha

Na segunda edição da história, temos esse épico encontro entre os dois heróis da Marvel. Enquanto Peter está tendo dificuldades em acabar com um vilão na cidade, surge o Surfista para lhe dar um auxílio. Após o embate, temos o início de uma conversa entre os personagens, que culminaria em uma experiência única para toda a humanidade.

No topo de um prédio, Surfista explica a Peter que não lhe resta mais muito tempo para ficar na Terra, e que gostaria de fazer uma última ação ao planeta que o acolheu por tanto tempo. Nesta cena, temos um dos diálogos mais incríveis que já tive o prazer de ler em uma história em quadrinhos, com o Aranha dando diversas sugestões ao Sentinela, cada uma com alguma ideia de como Norrin poderia agraciar as pessoas com seus poderosos dons. Neste momento, vemos o quanto o Surfista se importa com os humanos, o quanto gostaria que nós pudéssemos ter a capacidade de enxergar a vida com a mesma importância que ele enxerga; o quanto os humanos, mesmo com os mais diversos defeitos, ainda merecem a bondade e a paz.

Durante a conversa, o Surfista fala para Peter como é maravilhosa a sensação de liberdade que tem ao percorrer o cosmos com sua prancha e pergunta se o mesmo gostaria de experimentar. A escolha, contudo, acaba sendo de dar a oportunidade a outra pessoa: Mary Jane.

Após retornar de sua viagem transcendental, faltam palavras para M.J. relatar o que sentiu: a vivência, mesmo que por pouco tempo, do poder de Norrin, já foi suficiente para que a jovem se sentisse completamente livre, extasiada, e deslumbrada com o poder cósmico emanado pelo Sentinela, e que à ela foi concedido. Enquanto o Surfista se despede, Peter lhe diz que tem uma resposta para a pergunta que lhe fez mais cedo:

“Eu lhe disse que as pessoas não podem mudar o que são enquanto e a não ser que entendam o que podem ser. A não ser que elas saibam e sintam em seus corações. Se ele pôde estender o poder cósmico à M.J. e deixá-la sentir o que ele sente, deixá-la experimentar o tipo de liberdade que ele experimenta, deixá-la ver o mundo como ele vê… toda beleza, com o prospecto de paz sempre no centro disso… então não seria possível, por um mero momento, deixar o mundo todo sentir como isso é?”

E assim Norrin o faz. Em um esforço homérico, cede, por 5 minutos, seus poderes à todos os habitantes do planeta Terra, permitindo que toda a humanidade sinta o que ele é capaz de sentir, e que desfrute de toda a liberdade e entendimento que o Surfista Prateado possui. Em todos os cantos, por mais remotos que fossem, as pessoas foram agraciadas com o seu poder; em prisões, em lugares tristes e sem esperanças, em zonas de guerra e campos de tortura, a força do Sentinela das Estrelas conseguiu alcançar todas as almas humanas; nesses meros 5 minutos, a humanidade finalmente soube  – e Norrin também – o que é a paz e a esperança.

Stephen Strange e a batalha espacial

Logo antes de sair da Terra, Norrin é surpreendido com a presença de Stephen Strange, que diz estar ciente de sua condição graças a Reed. Nesse momento, soubemos através do Mago que as maiores mentes do universo Marvel estavam trabalhando para encontrar uma cura para o Surfista, embora não tenham obtido sucesso. Mesmo sem encontrar uma solução para o terminal problema, Stephen entrega ao amigo uma chama com todo o conhecimento da humanidade, dividida em duas partes: uma referente à vida na Terra antes da vinda do Surfista, e outra que foi criada após a sua chegada. Dessa maneira, além de uma forma de agradecimento por tudo que o Norrin havia feito em prol de seu lar adotivo e de seus habitantes, o Surfista teria noção de tudo de bom que conseguiu realizar com sua presença no nosso planeta.

Agora viajando pelo espaço e com destino à seu planeta natal, Zenn-La, Surfista se depara com um chamado vindo de uma grande nave. Ao adentrar o local, se depara com dois líderes, ambos de raças diferentes, que conversavam avidamente a respeito da guerra que ocorria há mais de 50 gerações entre seus povos. Os líderes, que tinham o conhecimento de que Norrin havia sido um arauto de Galactus, esperavam que o Surfista dissesse qual das raças estava mais evoluída, tendo em vista que se desenvolveram de forma paralela.

O grande ponto desta edição é o motivo pelo qual as duas raças estão brigando: intolerância. Por serem mundos que orbitavam a mesma estrela e que por eras não foram capazes de viajar de um planeta para outro, esperavam que o outro lado tivesse as mesmas crenças e dogmas. Contudo, quando conseguiram finalmente visitar seus conterrâneos, descobriram que eram completamente diferentes; tinham outros deuses, outros templos e outras ideologias. Dessa forma, ambas as raças decidiram investir anos e anos em armas de guerra, usando todos os recursos disponíveis e exigindo um enorme sacrifício das suas populações, no intuito de que um dia pudessem se enfrentar e impor o seu entendimento sobre o outro.

Durante gerações, a guerra se perpetuou, sendo mantida independente das mortes ou perdas. Os templos religiosos eram cada vez mais pomposos e engrandecidos, enquanto a população padecia. Ao saber desses fatos, Norrin questiona os líderes que o convocaram, perguntando qual o sentido de sacrificar o povo em nome de um conflito sem fim, e, porque, mesmo com toda a guerra que ocorria, os dois representantes estavam ali, sentados, conversando como se suas populações não estivessem sendo dizimadas em nome das desavenças.

Seguindo seu ímpeto de justiça e caráter, Norrin decide ele mesmo por um fim na interminável guerra. Destruindo as frotas armadas e, consequentemente impedindo os dois povos de se atacarem, partiu em direção aos planetas, um de cada vez. Com a intenção de mostrar que nenhuma das raças era superior à outra, destruiu seus templos até então invioláveis, fazendo com que as populações entendessem que haviam sido exploradas em prol de um conflito sem razão. Nesse dia, os povos finalmente se rebelaram contra seus líderes, e a “guerra sagrada” deu lugar à “paz sagrada”.

Como sua última mensagem, Norrin transmite seu suspiro de esperança e liberdade àqueles que antes estavam presos às amarras da dor e do sofrimento, mostrando que a violência da guerra jamais emergiria novamente.

“Se lugares sagrados são poupados das devastações da guerra, então façam de todos os lugares sagrados. E se o povo santo é mantido ileso da guerra, então façam de todos os povos santos”.

Zenn-La

De todos os destinos possíveis e existentes, dentre todos os mundos habitados pelas mais diversas raças e banhados pelas mais brilhantes estrelas, Zenn-La é aquele que outrora foi o berço da vida – e agora o leito da morte – do solitário Surfista Prateado. Desejando encontrar com sua amada e com seu povo, Norrin chega à sua terra natal, depois de viajar pelos confins do espaço. Seu estado terminal já é notável, e seus dias se tornam ainda mais curtos; mesmo empreendendo esforços para descobrir uma possível cura, os habitantes do planeta não encontram nada que sua ciência seja capaz de desenvolver.

Contudo, Norrin não foi à sua casa apenas para morrer: ele está em Zenn-La para viver seus últimos instantes. Já tendo aceitado e entendido seu destino, o Surfista quer aproveitar o tempo que ainda lhe resta ao lado daqueles que ama; quer garantir que, independentemente da sua morte, sua amada, Shalla-Bal, ainda será feliz.

Com o passar dos dias, a notícia do retorno de Norrin – e de sua morte iminente – se espelham pelo planeta. Os habitantes, como forma de agradecimento à tudo que o Sentinela fez em defesa do seu povo, prestam suas últimas homenagens, indo ao encontro do agora frágil Surfista. Em meio às despedidas, o planeta é novamente surpreendido, mas agora com a chegada do temido Galactus. Este, contudo, não tem a intenção de infligir nenhum mal àquelas pessoas: sua intenção é, assim como a de todos, poder se despedir do seu antigo arauto.

Ao conversar com Norrin, é lhe oferecida por Galactus uma tentativa de cura, afirmando, porém, que não sabe esta irá ou não funcionar. Mesmo com a oferta, o Surfista, que já fez de sua morte parte da sua jornada, nega; em contrapartida, pede ao seu antigo mestre que jamais tente destruir ou consumir o planeta, deixando que Zenn-La e seu povo vivam em paz.

E é com a promessa de Galactus que Norrin, finalmente, descansa. Entregando seu padecido corpo ao incontestável destino, o Surfista Prateado falece, deixando que sua alma siga para o plano do desconhecido. Pelos próximos três dias, Galactus permaneceu no planeta, velando o corpo de seu velho arauto juntamente com o povo que jurou proteger. Como uma última forma de honrar seu amado, Shalla-Bal pede ao Devorador de Mundos que, quando este partir e alcançar uma boa distância de Zenn-La, transforme o corpo de Norrin em uma estrela. E assim é feito.

Agora imortalizado como um astro brilhante, Norrin Radd virou a lembrança – e a esperança – de que tempos melhores sempre virão. Ao olharem para o céu noturno, os habitantes de Zenn-La se recordarão daquele que fez de sua jornada a própria busca pela paz, imortalizando a perseverança e a luta pelo que é certo.

“Quando ele morrer, leve-o e o corte em pequenas estrelas… e ele deve fazer a face do céu tão bela, que todo o mundo se apaixonará por esta noite, e não irão fazer adoração para o sol extravagante”. – Shalla-Bal


Mais do que uma indicação para fãs do personagem, Requiem é uma obra de arte que deveria ser lida e relida por todos. Sem a necessidade de conhecimentos prévios do Surfista Prateado ou mesmo do cânone da Marvel, essa graphic novel consegue entregar com uma maestria excepcional a mensagem que deseja passar. Como é de costume em histórias do Sentinela das Estrelas, a filosofia existencial e momentos profundamente reflexivos tomam conta das páginas, nos fazendo sentir, a cada palavra, um pouco do poder cósmico que os humanos experimentaram na história. Apenas leia… e sinta, por você mesmo, toda a lufada de esperança e liberdade que Norrin Radd sentiu em seus anos de vida.

Nota: Diamante.

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Deus em Pessoa está dentro, fora e no meio de nós

Cada indivíduo guarda dentro de si sua versão a respeito de Deus. Independente do “ismo” religioso que a pessoa escolhe seguir ele está lá. Inclusive se seu “ismo” começar com “ate” pois, afinal de contas, até para não acreditar é necessário ter uma noção do que se escolhe não seguir. Independente do nome ao qual você usa para designá-lo, Deus de fato está em todos os lugares e inclusive nas HQs, onde mesmo no mercado nacional já foram feitas tentativas de quadrinhos religiosos como Anjos de Deus, Smilinguido e o recentemente afamado Dudão, que apesar sua produção datar de meados dos anos 90, ganhou notoriedade em 2020 não só pelo seu conteúdo, mas também pela representação física dos personagens.

Porém, em Deus em Pessoa, o nosso famoso Divino aparece em sua forma definitiva. Finalmente o Todo Poderoso ressurge no meio de nós e, como consequência, tem um inestimável número de perguntas para responder, principalmente por sua suposta ausência tão duradoura.

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Aqui, Deus vive no mundo real finalmente entre nós. Mas, diferente da bíblia, sua maior criação já não é mais a mesma. Mais do que isso: o retorno do Senhor estimula o lado consumista do ser humano. Sua volta promove o lançamento de parques de diversões, livros, enfeites natalinos, pelúcias, jogos de quebra-cabeça e etc. Mas, por incrível que pareça, nada disso é muito diferente do que já vemos em nossas vidas, pois afinal de contas muitos já usam a religião como forma de exploração comercial.

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Como já dito, cada um tem sua interpretação específica do Eterno, que durante toda a HQ de Marc-Antoine Mathieu não tem seu rosto revelado e curiosamente, nenhuma religião ou seita específica é retratada durante toda a narrativa. Não vemos destaques a padres, pastores, rabinos ou qualquer outro líder por mais que, aqui na terra, são os maiores difusores de suas palavras sagradas. Isso não interessa em primeiro plano, mas sim a versão mais simples de interpretação individual.

A estrutura gráfica deste título é, perdão pelo trocadilho, bem conservadora. O traço de Mathieu é simples e as únicas cores usadas são preto, branco e cinza. Mas nada disso é um demérito ao fim das contas, pois o forte da narrativa está em seu texto repleto de reflexões profundas e filosóficas sobre a ciência, sociedade e religião. Assim como em seus ensinamentos expressos nos livros sagrados, a palavra torna-se protagonista em Deus em Pessoa.

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A edição a Comix Zone mantém o padrão de seus títulos anteriores. Para uma editora ainda jovem, é louvável a manutenção de um lançamento diferente a cada mês e ainda com a mesma qualidade em edição e acabamento. Neste último quesito, vale como menção o trabalho feito principalmente nas páginas 29 e 30, onde a tradução dos textos expressos nas placas protesto e capas de jornal foram totalmente traduzidas e adaptadas ao nosso idioma e na página 59, onde diversas fontes próprias tiveram que ter suas letras adaptadas para a escrita da mesma palavra, no caso, Deus.

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Para a editora, vale a pena apostar mais em títulos franco-belgas, pois esse é somente o segundo lançado até agora pela Comix Zone. Apesar da já citada jovialidade da editora, essa escola de HQ ainda tem um bem menor número de lançamentos se comparados aos quadrinhos argentinos lançados pela mesma. Igual David Byrne nos anos 90, a CZ faz um ótimo trabalho descobrindo a América tal qual Cristóvão Colombo e Vicente Pinzón, mas ainda falta uma maior exploração no Velho Mundo, e é esperado que Deus em Pessoa marque essa retomada que se iniciou em Boca do Diabo e que se espere que não fique só nesses dois títulos.

Deus está vendo. Está por aí, por aqui, por acolá ou dentro e fora de nós. Ele está inclusive nas nossas HQs, seja em seu conteúdo ou no material utilizado para sua confecção. Não adianta tentar retira-lo de sua cabeça, pois quando se menos esperar ele aparece de surpresa, assim como nessa obra.

Deus em Pessoa
Marc-Antoine Mathieu (roteiro e arte)
Érico Assis e Fernando Paz (tradução)
Audaci Júnior (revisão)
128 páginas
29 x 21 cm
R$79,90
Capa Dura
Comix Zone
Data de publicação: 03/2021

 

 

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O Imortal Hulk: Os monstros condenados

Para aqueles – como eu – que nunca colocaram a mão em uma revista do Golias Esmeralda, O Imortal Hulk, da dupla criativa Al Ewing e Joe Bennett, é, além de ótima porta de entrada, uma obra precisa ao explorar as raízes da humanidade e destrinchar o sentido, a razão e o fardo de ser humano (ou monstro?). A escrita ágil e a arte incomparável são as principais razões da qualidade surpreendente do material, que não só fará qualquer curioso se interessar a explorar o vasto universo do personagem, como também servirá de comparação para obras futuras e passadas.

Sem ter qualquer contato com materiais do Hulk, houve um receio inicial ao comprar as primeiras seis edições lançadas até a data desta publicação pela editoria Panini; pelo simples fato de um dos personagens que menos me atraiu no universo dos heróis ser o título da revista. Embora nunca tivesse motivos para desgostá-lo, Hulk nunca foi foco da minha atenção e tampouco do meu tempo de leitura, e as histórias provenientes dele ficavam fora do radar, sem contar o seu universo riquíssimo que foi deliberadamente negligenciado por mim. Contudo, a experiência elucidou o quanto estava errado sobre o personagem-título.  Isto prova o brilhantismo da linha comandada por Ewing e Bennett; ambos construíram uma trama tão atraente, complexa e reflexiva, que mesmo o cara mais desinteressado ficaria com os olhos vidrados da capa à quarta capa.

Essa foi minha experiência ao ler O Imortal Hulk, que ainda não foi finalizado – e no Brasil está um pouco atrás das publicações americanas por conta da distribuição, fator comum aos leitores brasileiros cientes das dinâmicas do mercado de quadrinhos no país. Todas as edições contam com um trecho inicial, que simplifica os temas abordados no quadrinho e promove uma marca registrada e exclusiva de edição por edição, dando importância às suas individualidades e abordagens, enquanto algumas priorizam a ação, principalmente quando os Vingadores, a Tropa Alfa e a Base Sombra aparecem, outras partem para construções filosóficas – marcadas por tentativas de conceber e interpretar imagens sobrenaturais e divinas -, além daquelas que fogem um pouco dos temas principais, e demonstram a inventividade da dupla pela alternância dos traços e do conteúdo, como a terceira revista, que trabalha com relatos fragmentados de um mesmo caso específico suspeito da presença do Hulk.

Homem, Monstro ou… ambos? Eis a primeira pergunta do quadrinho, eis o legado de Bruce Banner… conviver com um monstro interior que desperta à noite, mas de dia o atormenta – e o reflexo de vidro é um ótimo artifício para ilustrar o conflito de sua identidade. Porém, as escolhas artísticas acabam favorecendo a presença do Hulk em detrimento de Banner, com visual assustador; um monstro em forma de demônio verde. A arte de Joe Bennett é a razão para O Imortal Hulk ser tão aclamada pela crítica e público. Através do roteiro de Ewing, o quadrinista retorna às raízes do personagem para desenhá-lo da maneira mais assustadora e terrível possível. Hulk é um monstro? Demônio? A outra face de Deus? Diabo? Maldição? Bem, toda maldade grotesca – e bondade aparente – imaginável cabe para descrever as figuras traçadas por Bennett.

A exploração física dos membros, dos músculos e das transformações do Hulk é outro ponto para se prestar atenção. E as escolhas sempre trabalham a favor da história a ser contada; quando Hulk se assemelha ao herói comum, que busca trazer justiça (um tanto quanto distorcida), sua representação é grandiosa, peito estufado, a clássica imagem do personagem. Contudo, quando ocasiões mudam sua aparência (absorção de radiação, mega explosões, secreções digestivas que drenam energia) a imagem do Hulk se transforma em algo grotesco, lembrando um demônio em pé.

E a dinâmica entre os artistas fica ainda mais evidente em momentos pontuais; quando Hulk está no inferno com a radiação absorvida, como se estivesse sofrendo uma punição divina, um julgamento moral e religioso, seus músculos enormes dão espaço para sobras de pele, penduradas pelos ossos finos, e mesmo assim sua ânsia por violência o faz lutar bravamente e incansavelmente, confundido-se com um morto-vivo. Há outras sequências que o tornam como um espantalho, pernas, braços e olhos arrancados, enquanto em outras seus membros são divididos em prol de experimentos. É absolutamente agonizante e igualmente extraordinário, uma arte de tirar o fôlego restitui a figura monstruosa do Gigante Esmeralda.

Essa mesma arte colabora com a construção narrativa de toda a saga do Imortal Hulk. A exploração física de Hulk é proporcional à exploração psicológica de Banner; a pergunta Homem, Monstro ou… Ambos? é, desta maneira, o condutor das opções de Ewing. Qual é a maior atribuição de Hulk? O físico. E a de Banner? A mente. Dessa forma, as maiores notoriedades de ambos tendem a ser desmembradas e exploradas por Ewing, em uma jornada que julga – ao mesmo tempo que venera – as figuras do homem e do monstro. Hulk é a sombra, o reflexo do homem, que surge à noite; soa como maldição, pagamento dos pecados de Banner, mas também soa como milagre, um dom único, já que a essência de Hulk é – por Ewing e Bennett – naturalmente dúbia (repare as distinções entre a mão esquerda e direita de Deus).

Se a essência de Hulk é dúbia, os nossos temores a ele também seriam? O medo das pessoas é devido à sua monstruosidade, capacidade destrutiva, ou há um componente de inveja humana? Afinal, a capacidade de exteriorizar demônios e emoções, vista como fardo e milagre, se tornou inerente a Banner, sendo assim, o medo pelo Hulk não é apenas por representar uma ameaça física e psicológica, mas ser a prova frustrante da nossa incapacidade enquanto humanos: não podermos, nem um dia sequer, nos transformarmos em nossos próprios reflexos.

Pensando na perturbada mente de Banner, que compartilha-a com outras identidades, o quadrinho aborda a inquietude e o tormento do protagonista – desde elipses por conta de trocas de identidade, quando o quadrinho apenas salta de um momento para outro sem explicação, até a maneira quando os pensamentos, tanto de Bruce como de outros personagens secundários, se intercalam com as sequências de ação, do seu desenvolvimento ao desfecho. As próprias citações iniciais também são exemplos de como Ewing traça o tom da edição com certo estilo de contexto, variando da literatura à religião, do cinema ao teatro, flertando com lições da psicologia analítica.

Nota-se como o artigo tem mais perguntas do que respostas concretas. Isso ocorre de forma semelhante no quadrinho. Em nenhum momento, pelo menos até onde li, os autores resolvem seus raciocínios e julgamentos, apesar de apresentarem respostas possíveis. Não batem o martelo, levantam questões, criam e desenvolvem dúvidas pertinentes que acompanham os pensamentos de Banner e do leitor. Há um movimento contemporâneo nos quadrinhos de herói, pegando o exemplo do roteirista Tom King, que é de explorar mais a humanidade nas histórias de heróis; enquanto King gosta de experimentar uma relação íntima com o fã, através da emoção e dos dramas dos personagens, a dupla trata de trazer questionamentos constantes, que colocam em xeque a própria humanidade do leitor.

Ewing e Bennett traduzem questões reflexivas contemporâneas em um ótimo quadrinho de ação, aventura e terror. Enquanto a ação e a aventura estão ao longo da história, o terror circunda por fora ao enaltecer e insistir nas perturbações de Banner e explorar sua relação com o Hulk, partindo de argumentos, citações e alegorias religiosas, filosóficas e políticas. Se Banner parece estar condenado a viver para sempre em seu confuso e tenebroso universo pessoal, o quão diferente nós somos dele, ao compartilharmos um fardo tão semelhante quanto viver neste mundo?

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Invencível: principais diferenças entre a série e os quadrinhos

Você sabia que o novo sucesso da Amazon Prime Vídeo é baseado em uma HQ? Escrita por Robert Kirkman (The Walking Dead, The Oblivion Song) e ilustrada por  Cory Walker e Ryan Ottley, Invencível começou a ser publicada em 2003 pela Image Comics, sendo concluída com 144 edições e 25 encadernados nos Estados Unidos.

Mesmo mantendo um padrão de narrativa muito parecido, as versões apresentam algumas diferenças entre si.  Abaixo, listamos as principais mudanças ocorridas na série, para que você não fique por fora de nenhum acontecimento.

Traço

As 7 primeiras edições de Invencível foram desenhadas por Cory Walker. Podemos dizer que a pegada de Cory é bem característica, entregando uma identidade única à obra. Logo após, quem assume os desenhos é Ryan Ottley, mudando um pouco o visual.

Mark por Cory Walker e, ao lado, por Ryan Ottley.

Na série, temos um estilo mais “fluido”, que nos lembra várias animações clássicas de super heróis. A animação é super competente, nos entregando ótimos planos e movimentações, além pegar pesado nas cenas de violência.

Mark e seus colegas de colégio na animação.

 

Assassinato dos Guardiões do Globo

Na série, Omni-Man, ainda no primeiro episódio, mata todos os Guardiões do Globo em uma cena extremamente gráfica e de violência explícita. Após uma luta árdua com seus companheiros, o até então “herói” consegue realizar seu objetivo, porém, acaba sendo gravemente ferido.

Omni-Man após assassinar os Guardiões na série e, abaixo, nos quadrinhos.

Nos quadrinhos, essa cena só ocorre na edição número 6, e é bem mais curta e menos violenta. Em poucos quadros, já vemos todos os heróis sendo mortos rapidamente, e Omni-Man sai ileso.

 

Luta contra os Flaxans

Na HQ, a primeira aparição dos Flaxans acontece enquanto Omni-Man e Invencível estão voando juntos. Pai e filho lutam contra a invasão alienígena, e Omni-Man acaba sendo sugado pelo portal interdimensional dos invasores.

Na série, contudo, o ataque dos Flaxans ocorre enquanto Omni-Man ainda está no hospital, ferido após massacrar os Guardiões do Globo. É durante a invasão que somos apresentados a Tropa Teen e seus integrantes, que combatem os verdinhos.

Flaxons
Flaxans em sua primeira aparição na série.

 

Tropa Teen

A primeira aparição dos jovens heróis também muda de uma mídia para outra. Enquanto na série isso acontece na primeira luta contra os Flaxans, nos quadrinhos é Mark quem acaba se encontrando com a Tropa.

Tropa Teen
Invencível junto com a Tropa Teen.

À noite, enquanto testava seus poderes de voo pela cidade, Invencível acaba se deparando com vilões roubando aparelhos de vídeo game em uma loja. Logo em seguida, chega a equipe para combater o crime, e temos uma breve interação entre os adolescentes.

Primeira aparição da Tropa Teen nos quadrinhos.

 

Origem do codinome “Invencível

Na versão em quadrinhos, após uma briga com um valentão, Mark vai parar na diretoria. É conversando com o diretor que surge a ideia para seu nome de herói, após o mesmo dizer para Mark se lembrar de que “não é invencível”. Entretanto, na série, a ideia surge a partir de uma fala do Omni-Man, que diz para Mark que ele é “realmente invencível”.

 

Debbie e Amber

Nos quadrinhos, o desenvolvimento das personagens femininas é bem raso. Tanto Debbie – mãe de Mark – como Amber, tem seus papeis reduzidos a meros assessórios do protagonista. Debbie está sempre em casa, sendo bem passiva com relação aos acontecimentos envolvendo seu marido e filho. O início do relacionamento entre Amber e Mark também é bem vazio – nem sabemos o nome dela até Mark abrir um bilhete que a garota lhe entrega. O casal tem poucas conversas e Amber também tem uma posição complacente quanto as constantes ausências de seu namorado.

Primeira interação entre Mark e Amber.

Na série, temos uma participação mais ativa das duas. Debbie tem mais voz, conversa bastante com Mark e tem um papel bem relevante na vida do personagem. Amber, seguindo na mesma linha, tem bem mais atitude do que nas HQ’s. Seu interesse em Mark é mais desenvolvido e o casal tem uma química que faz bem mais sentido.

 

Os adolescentes-bomba

Logo nas primeiras edições dos quadrinhos, somos apresentados a uma curta trama envolvendo o professor de física de Mark e Eve. Nela, o professor sequestra e transforma alguns de seus alunos em bombas humanas, com a intenção de vingar o rumo que sua vida tomou após a morte de seu filho.

A série, contudo, deixou de lado essa parte da história, não citando o ocorrido. Cabe frisar que tal ato não prejudica de forma alguma o rumo da história, e é totalmente descartável.


É importante dizer que a série ainda está em sua primeira temporada. Os criadores optaram por pegar alguns acontecimentos que ocorrem posteriormente nos quadrinhos e incorporá-los logo de início, mas isso não causa nenhum prejuízo à história. Se você gostou da animação, deixo aqui a minha sincera indicação das HQ’s, tanto como um “spoiler” dos próximos episódios como também uma complementação ao que foi apresentado.

Os quadrinhos de Invencível podem ser encontrados na Amazon através dos links abaixo!

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4 versões em quadrinhos de livros famosos que você precisa conhecer

Você é do time que prefere livros ou graphic novels? Independente da sua preferência, tenho certeza que essa lista despertará 100% do seu One for All literário.

Fahrenheit 451

Situado em um futuro distópico, Fahrenheit 451 nos mostra uma sociedade em que ler e ter livros é estritamente proibido. Os “bombeiros”, funcionários responsáveis por cessar tais atos ilícitos, se encarregam de queimar os livros e perseguir aqueles que os possuem. O título da obra faz alusão à temperatura de queima do papel, em graus fahrenheits. Publicado pela primeira vez em 1953, o romance de Ray Bradbury ganhou uma adaptação em quadrinhos em 2009, escrita e ilustrada por Tim Hamilton e publicada aqui no Brasil pela editora Excelsior.

1984

Grande clássico de George Orwell, 1984 também se passa em uma realidade distópica, mais precisamente no ano que dá nome ao livro. Situado na “Pista de Pouso Número 1”, na província do superestado da “Oceania”, Orwell nos mostra uma vida completamente vigiada, pensamentos totalmente reprimidos, ideias cerceadas e um governo absurdamente totalitário. Tendo o “Grande Irmão” como líder do Partido regente, os cidadãos são direcionados a uma total obediência e submissão, não sendo permitida qualquer tipo de discordância e dissidência. Adaptado e ilustrado pelo artista brasileiro Fido Nesti, o quadrinho foi lançado em 2020 pela editora Quadrinhos na Cia..

A Revolução dos Bichos

Também de George Orwell, A Revolução dos Bichos é uma breve e potente fábula que aponta as ironias e contradições do regime socialista da União Soviética stalinista. A trama se passa em uma fazenda, e temos a percepção dos fatos através dos animais que habitam o local, bem como a sua indignação com o tratamento à que são submetidos pelos humanos da propriedade. Tendo como objetivo sua emancipação e liberdade, os animais, liderados pelos porcos, se “rebelam” contra os humanos e passam a viver em uma sociedade utópica. No entanto, com o passar do tempo, percebe-se que “todos os animais são iguaismas alguns animais são mais iguais do que os outros”. A adaptação foi realizada pelo também brasileiro Odyr, e publicada em 2018 pela editora Quadrinhos na Cia..

Sapiens – Uma Breve História da Humanidade

Baseada no best-seller homônimo de Yuval Harari, esta graphic novel nos conta, de forma didática e muito bem ilustrada, a evolução humana e, consequentemente, a evolução do mundo. Passando dos neandertais até o homo sapiens sapiens, temos um excelente panorama científico, histórico e cultural da até então espécie dominante do planeta Terra. Adaptada por Daniel Casanave e ilustrada por David Vandermeulen, Sapiens foi publicada pela editora Quadrinhos na Cia. em 2020. 

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A Casa, de Paco Roca, tem em sua moradia saudades e lições de vida

– Pai, agora você vai ficar aqui e a enfermeira vai cuidar do senhor. Vai ficar tudo bem.
– Obrigado por cuidar de mim.
– Sempre vou cuidar do senhor, pai.

Esse foi o meu último dialogo com meu pai antes dele falecer em setembro de 2020, depois de passar uma madrugada com ele no hospital. Ele teve um câncer que em um mês e meio o levou. Fui o último filho a vê-lo com vida. E ainda não é fácil.

No posfácio de A Casa, Fernando Marías diz que a morte do pai é um dos grandes desafios da literatura. Por um lado é complicado para o autor não seguir somente os instintos e sentimentos, à mercê de dúvidas racionais que chegam de todos os lados. Por outro lado, a escrita meio que flui mais tranquila, parecendo que o pai morto está passeando com o filho. E realmente a obra de Paco Roca você sente a presença do pai dos personagens vivendo e pulsando pela casa em questão.

“As mesmas histórias tristes que se ouve dizer. Dessa vez o escolhido fui eu.” (Honrar teu Nome – CPM #22)

A história gira em torno de três irmãos que perderam o pai e agora precisam decidir o que fazer com a casa, que antes era de veraneio quando eram crianças, e veio se tornar a moradia definitiva dos pais. Assim como é o normal da vida, todos os filhos seguiram seus destinos, saindo das tutelas familiares, mas chegou o momento de encontrar novamente com o passado e o pior, ter que decidir o que fazer com esse passado.

Em meio a lembranças, que na maioria dos casos são boas, os três filhos se apegam a casa que o pai deixou em uma viagem no tempo com essas lembranças. E como eu disse são lembranças boas, porque é do ser humano lembrar somente das coisas boas de pessoas recém falecidas. Isso me remete ao pequeno dialogo que está no inicio desse texto, por mais que seja uma lembrança dolorosa é uma boa lembrança. Pois ali eu vi que pela primeira vez em um mês em meio, o meu pai estava em paz. Ele estava se sentindo bem. Por isso guardo esse momento com tanto carinho. Obviamente existem momentos melhores.

Com uma leveza pura e uma arte que descansa os seus olhos, A Casa de Paco Rosa é uma delícia de leitura, todo detalhe dela parece ter sido feita com amor e cuidado de não forçar um sentimento no leitor, mas sim de fazer a gente adentrar na casa e se sentir membro da família e se sentir apegado e amado pela casa. É como o leitor fosse um “quarto irmão”. Não é uma história de manter legados e sim de cultuar e celebrar o que foi construído. Não somente em bens materiais, mas também com sentimentos, ensinamentos e lembranças.

“Naquela mesa ‘tá’ faltando ele. E a saudade dele ‘tá’ doendo em mim” (Naquela Mesa – Nelson Gonçalves)

A Casa também fala de elos quebrados e “desquebrados”. A família tinha um elo de união que era a casa onde passavam as férias, quando cada um segue a sua vida, esse ela é partido. E o elo se refaz, e esse elo é o pai recém-falecido, ela já não se encontra mais unida há tempos (o que é normal também), a obra apresenta como o único elo que era a união da família depois de quebrado, pode vir a unir todos depois. Pois isso também é da natureza humana, sofrer um machucado e lamberem as feridas juntos. Mas se essa união irá continuar… quem sabe?

A Casa atinge em cheio quem já perdeu um ente querido, seja qual membro familiar for ou até mesmo aquela amizade. Mas a obra também atinge quem não perdeu ninguém. Pois faz aflorar a ideia que temos que celebrar enquanto estamos vivos, criar boas lembranças, pois um dia tudo vai passar. No meu caso não foi uma obra fácil de ler, mas também não me levou às lágrimas. Ela me passou uma coisa boa, e um tanto clichê, de que a vida é assim. Tudo passa e que devemos continuar sempre em frente.

A Casa foi publicada aqui no Brasil pela Devir, tem formato 24,7 x 17,9 cm, capa dura, 136 páginas coloridas e a tradução da Jana Bianchi.

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Quem é de fato Degenerado?

Desde que o Grupo Editorial Autêntica decidiu se aventurar no mercado de histórias em quadrinhos brasileiro fundando a Nemo, seu selo voltado a esse mercado passou por algumas transformações: começou intercalando entre material nacional e estrangeiro com autores consagrados do mercado franco-belga em publicações com grande formato e capa dura. Experimentando novas fontes e em busca de adaptação perante as exigências do mercado e público, estabeleceu-se com material autoral da cena alternativa europeia e norte-americana. Prestes a completar uma década de vida em 2021, a Nemo traz em seu mais recente lançamento Degenerado, um título que, mesmo que de forma indireta, tem muito a ver com suas mudanças ao longo desses anos.

Não é fácil ser alguém. Mesmo cada um em particular pode não saber profundamente quem é ou o que gostaria de ser. A vida e nossa forma de viver é feita de experiências, de riscos que trazem acertos, erros, vitórias e derrotas. Não existe vida sem risco. Em boa parte ou até por pura teimosia, só temos consciência do resultado de nossas escolhas caso as coloquemos em prática.

Paul Grappes e Louise Landy conheceram-se ainda jovens em uma confraternização entre amigos. Como diversos casais afogados na ingenuidade da paixão de um pelo outro, casaram-se desejando passar o resto de suas vidas juntos. Mas então veio o serviço militar e Paul, por uma lei que ia além de seu poder, precisou se alistar no exército. Então em 1914 estoura A Grande Guerra, a Guerra das Trincheiras, trincheiras que foram usadas não só para separar o militar recém-promovido a cabo de seus adversários, mas também de sua amada.

IMAGEM: Grupo Autêntica

Afetado pelos horrores que presenciou, Paul torna-se desertor no intuito de voltar aos braços de Louise e para fugir da prisão iminente aos que abandonam o campo de batalha, começa a se vestir e comportar como mulher assumindo a identidade de Suzanne. Porém, Paul aos poucos vai não apenas se adaptando, mas desfrutando de sua nova vida, assim percebendo que talvez agora sim era a pessoa que desejava ser e que sempre esteve dentro de si, e não a pessoa que era outrora e apresentava em seu exterior.

IMAGEM: Grupo Autêntica

Em uma alternância quase impossível, os desenhos de Chloé Cruchaudet conseguem ao mesmo tempo serem pesados e delicados. O clima pesado e os horrores da guerra coexistem em uma Paris retratada quase sempre em tons de cinza, salvo raras exceções onde as cores azul e vermelho, que representam na cultura popular liberdade e fraternidade na bandeira da França, gritam por espaço na narrativa densa como uma neblina.

Baseada em uma história real, Degenerado é em grande parte sobre uma crise existencial em consequência da guerra, mas pouco abordada ou sequer imaginada por muitos de nós. Suzanne na verdade pedia socorro dentro de Paul Grappes para mostrar que existia. A possibilidade de contar sua história que resultou no livro La Garçonne et L’Assassin mostra que sua necessidade de se esconder era na realidade a chance de se libertar adentrando em um novo mundo. O ser humano é frágil como uma casca de ovo, porém quase sempre é obrigado a ostentar-se tal qual uma pele grossa e pouco permeável como a de um réptil.

IMAGEM: Grupo Autêntica

Estabelecendo-se já há algum tempo em um formato característico, edição da Nemo segue os padrões anteriormente adotados pela editora, com capa cartonada e papel couchê em formato 25 x 19 cm. Esta é a primeira obra de Cruchaudet publicada no Brasil, e a escolha por Degenerado em sua estreia provavelmente deve-se à quantidade de prêmios arrebatados pela obra principalmente na França e Itália. Assim como já fez com outros quadrinistas da Europa, a exemplo de Fabién Toulmé e Gauthier, vale a pena apostar em outras obras da autora por aqui, mesmo outras sendo menos conhecidas ou agraciadas, mas ainda assim trazendo frescor ao mercado brasileiro. Como sugestão, vale conferir por exemplo Groenland Manhattan e La croisade des innocents, publicadas originalmente em 2008 e 2015.

Degenerado
Chloé Cruchaudet (roteiro e arte)
Renata Silveira (tradução)
Bruna Emanuele Fernandes (revisão)
190 páginas
25 x 19 cm
R$69,80
Capa Cartonada
Nemo
Data de publicação: 11/2020

 

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A confortável viagem na sinestesia de Paul Está Morto

Muito se idealiza sobre o passado. Existe sempre uma aura de sagrado em tempos anteriores pois o distante parece irretocável. Na literatura, Luis de Camões já demonstrava essa questão em Os Lusíadas, onde os portugueses em vias de desembarcar e explorar as Américas no século XVI enfrentavam criaturas que iam além da compreensão humana em mares nunca antes navegados. Na Idade Contemporânea não é necessário ir muito longe para alcançar um período onde o real e fantástico se entrelaçam: a segunda metade da década de 60 do século XX isso era visto tanto na música quanto nas histórias em quadrinhos, pois nem a lama de Woodstock foi capaz de sujar essa época.

Nos quadrinhos, a editora Éric Losfeld trazia ao público europeu cores berrantes e viagens psicodélicas que muito se questiona a respeito da sobriedade de seus autores. Barbarella, Kris Kool, Saga de Xam, Les Aventures de Jodelle e outras histórias estavam na vanguarda da narrativa gráfica em uma onda que até hoje não se desfez. O datado aqui não existe e o tempo nem sequer pode ser considerado relativo: na verdade, ele nem é cogitado. Por isso, todas essas obras continuam futuristas até hoje.

Kris Kool e Saga de Xam marcam o experimentalismo e psicodelia na narrativa gráfica até os os tempos atuais (IMAGENS: 50watts.com e formidablemag.com)

Investigando esse mesmo fenômeno no ramo da música, chegamos logo aos Beatles. Os rapazes, que eram o sonho de qualquer qualquer filha para se casar, deixavam para trás sua marca de bem-comportados. Tal atitude se tornou mais evidente em 28 de agosto de 1964 quando em um quarto de hotel Bob Dylan os apresentou a maconha. O quarteto até tentou disfarçar: lançou logo depois os álbuns Beatles For Sale e Help! que ainda trazia sua marca já conhecida, mas o logotipo do subsequente Rubber Soul, lançado menos de quatro meses depois do álbum anterior, já denotava que algo diferente já pairava não só no ar, mas também nos pulmões e na cabeça da banda mais célebre de Liverpool. Para nossa sorte, o “estrago” feito por essa e outras drogas já estava feito e os melhores álbuns dos Beatles foram lançados a partir daí.

IMAGEM: Comix Zone

Paul Está Morto se passa justamente nesse período: no ano seguinte ao lançamento de Rubber Soul e entre o lançamento dos aclamados álbuns Revolver e o Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band. As cores das roupas, os experimentos nas gravações em estúdio, as discussões estressantes de uma vida que era dedicada quase que em sua totalidade ao trabalho dos músicos atacaram o hemisfério direito dos autores estreantes no mercado editorial brasileiro Paolo Baron (roteiro) e Ernesto Carbonetti (desenhos) em busca de uma narrativa livre sobre o que pode ter acontecido nos bastidores do que viria ser o ápice dos Beatles, mas que resultou na dissolução da banda cinco anos depois. O hemisfério direito do cérebro, responsável pela criatividade humana responsável por parir Paul Está Morto, é coincidentemente a mesma região mais influenciada pelos efeitos da marijuana, musa do grupo musical a partir de então.

Por isso mesmo, não dá para fugir da psicodelia gráfica em Paul Está Morto: as cores são extremamente vivas e ditam o ritmo da narrativa. As cores marcam a tensão, velocidade e linha temporal a cada quadro em que a história se desenvolve. As cores pulam, esparramam e fogem dos quadros quase espirrando no rosto do leitor, trazendo-o para dentro da história e o colocando como testemunha ocular da turbulenta vida particular que era abafada pelos sorrisos talvez forçados fotos para revistas e jornais, gravações de discos, aparições na TV e qualquer representação de mídia onde era praticamente uma obrigação passar a imagem de que os Beatles era uma banda formada por pessoas perfeitas, mas a verdade era muito diferente.

IMAGEM: Comix Zone

Como já bem denota no título, a HQ mostra a tentativa de abafar a notícia da suposta morte de Paul McCartney e suas irreversíveis consequências. A influência dos Beatles era tão grande a ponto de temer uma onda de suicídios em massa por fãs da banda. Era mais do que necessário que a situação nunca viesse à tona, inclusive buscando um hipotético sósia. O mais interessante dessa visão nas entranhas na história da música é o destaque dado a Geoff Emerick (engenheiro de som), George Martin (produtor) e principalmente Brian Epstein, empresário dos Beatles. Tais personagens costumam cair no esquecimento e seus nomes são apagados como marcas na area da praia, mas não aqui.

IMAGEM: Comix Zone

A edição da Comix Zone faz jus à questão gráfica da HQ. A impressão da Ipsis Gráfica mantém o nível das cores que, caso não fosse bem executado, estragaria a leitura. O papel couchê aqui se torna imprescindível para trazer as cores mais vivas e reluzentes possíveis da arte de Carbonetti, justamente como se via nos projetos gráficos oficiais que envolviam os Beatles de 1966 em diante. Como extras, temos depoimentos e comentários dos autores a respeito de seu roteiro e arte, e como trouxeram sua marca pessoal em uma história já tão conhecida e com personagens mais famosos ainda, ainda mais usando como referência imagens reais dos personagens. É difícil trazer algo novo para uma história que praticamente se tornou um conto do folclore mundial, ainda mais mantendo um ritmo quase musical à leitura.

Até hoje especula-se se Paul de fato é o mesmo ou foi substituído. Diversas teorias da conspiração são discutidas através de supostas mensagens subliminares nas capas de álbuns dos Beatles do Sgt. Peppers até Let it Be, último álbum da banda. No fim das contas, podemos somente imaginar. Nada é comprovado, e não sabemos se isso é o mundo real ou mais uma viagem psicodélica como tantas outras. Para nós, basta apenas se divertir com tudo isso, e a versão apresentada em Paul Está Morto cumpre esse papel.

Paul Está Morto
Paolo Baron (roteiro)
Ernesto Carbonetti (arte)
Thiago Ferreira (tradução)
Audaci Júnior(revisão)
120 páginas
24 x 17 cm
R$59,90
Capa Dura
Comix Zone
Data de publicação: 09/2020