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O Superman por Zack Snyder: O Centro de um Universo

“Deve existir um Superman? Ele existe.” 

O Superman é um personagem muito mais complexo do que todos imaginam. As pessoas têm uma ideia de que ele é apenas um cara poderoso que sempre salva o dia. Ninguém questiona se ele tem dilemas. Ele é apenas mais um super-herói aos olhos do público. Certa vez, Grant Morrison disse que a bomba atômica era uma ideia e que o personagem era uma ideia melhor.

Eu particularmente compartilho da mesma opinião. É um personagem extremamente completo. Ele é multicultural, calmo, poderoso, questionador e transgressor. Christopher Reeve pode ser o Superman para o público até hoje e dificilmente este texto mudará o senso comum. Entretanto, Henry Cavill é provavelmente o Superman mais completo até hoje. Na verdade, o trabalho de Zack Snyder e toda a sua equipe é provavelmente o mais amplo já realizado com o personagem na história do cinema. Ele é o centro de um universo.

“E se uma criança sonhasse em se tornar algo diferente do que a sociedade havia determinado a ela?”

O elemento de escolha é a discussão central na Krypton de O Homem de Aço. Uma sociedade progressista a qual se torna ambiciosa e utópica buscando pela perfeição com o controle artificial populacional. Isso acaba com toda a liberdade e direito de pensar ou questionar de um indivíduo. Reprodução é um tabu neste planeta e isso está implicitamente expresso nas estruturas e veículos. Jor-El e Lara conceberam Kal-El naturalmente para que ele pudesse escolher o seu destino e fosse uma ponte entre os kryptonianos e a humanidade, perpetuando a espécie de forma pacífica, não utópica. Nele está chance de trazer um amanhã melhor.

Esta versão se inspira na artificialidade do Homem de Aço de John Byrne e na humanidade e progresso do Legado de Estrelas de Mark Waid. É a pior origem do personagem somada à melhor e resulta em algo novo, fantástico e marcante. É interessante ver como este tema, a vida artificial, se repete nos outros filmes com o Apocalipse e com o Superman. Chegaremos lá.

Ele não é apenas de Krypton, ele cresceu na Terra. Diferente de outras versões, Martha e Jonathan Kent não apenas ensinam Clark sobre a bondade, mas sobre proteção. A visão realista se encaixa exatamente neste ponto. Pais tentam proteger os seus filhos todos os dias, por que seria diferente se ele fosse alienígena? Como as pessoas iriam reagir ao um ser de outro planeta caminhando entre nós? Provavelmente não o aceitariam e esse é o medo dos pais de Clark. Ele não salva o seu pai do tornado justamente por causa disso.

Eles não o privam de decidir. Aqui, a escolha é mais comum em relação a Krypton. Então o menino cresce com liberdade, mas precisa encontrar um limite entre isso e os poderes. É alguém vivendo em um mundo de papelão o qual pode desmoronar a qualquer momento se ele não tomar o cuidado. Mas algo que os kryptonianos desconheciam e Jor-El não, são as consequências das escolhas. Jonathan explica isso a Clark com a seguinte frase: “Bom ou mal, você mudará o mundo.” Então para o Superman, escolhas têm um peso muito maior do que as nossas.

Entretanto ao usar seus poderes, ele perde esse limite. Ele sabe das consequências reais a partir do momento no qual ele mata Zod. Isso não é uma descaracterização, já aconteceu nos quadrinhos, mas nunca para moldar o código moral do Superman. É isso o que O Homem de Aço faz: Moldar este código após ele tirar a vida de alguém pela primeira vez. A única forma de definir o que é certo ou errado, é experimentando o errado e consequentemente  aprender com o mesmo.

“Este é o meu mundo. Você é o meu mundo.”

Ao final do primeiro filme, Superman declara ajudar a humanidade, mas deverá ser nos termos deles. Não é o que acontece. Batman vs Superman é basicamente a resposta para O Homem de Aço. O mundo está pronto para ele? Não, pois tudo o que é diferente ou novo é visto por alguns como pavor e ódio. Bruce Wayne não odeia o Superman, apenas tem medo do que ele pode vir a se tornar.

Essa paranoia de que seremos controlados por um deus em breve é o que o afasta cada vez mais de sua humanidade. Enquanto Lex Luthor tem inveja do Superman, pois não acredita que possa existir uma figura perfeita neste mundo e se ela existe, por que não apareceu antes quando ele precisou? Ambos colocam a culpa nele por atos os quais ele não praticou: Destruir Metropolis e o abuso infantil. Por que ele não estava lá?

É exatamente o pensamento das pessoas aqui fora: “Por que ele não levou Zod para fora da cidade?” Ele até tentou, mas o Zod era um guerreiro nato. Questionamos se o Superman precisa sorrir, ou salvar alguém? Ele é incompreendido na película e na realidade. Na maioria das vezes, ele está sendo o cara que faz a coisa certa enquanto negam o poder de auto-afirmação dele. Ele é apenas acusado por aquele incidente na vila africana porque ele interferiu em assuntos políticos. Ele constantemente tenta ser o herói clássico e fazer o melhor o qual ele pode. Mas como Perry White diz: “Não estamos mais em 1938.”

É algo semelhante, se me permitem comparar, ao que Joe Kelly fez em Olho por Olho. Nesta história em quadrinhos, um grupo violento chamado a Elite surge e o mundo passa a considerar o Superman antiquado. Onde está o sonho americano? Você deve estar se perguntando. Está olhando para ele e está o machucando. Talvez não devêssemos comparar as ações de um vigilante com um protetor mundial, mas quanto aos métodos do Morcego no filme? Apenas uma pessoa, além dele, questiona. Chris Terrio e David Goyer inverteram os papeis dos personagens em O Cavaleiro das Trevas. Mas curiosamente, o Superman do filme não se assemelha ideologicamente ao Batman da HQ.

O Cruzado de Capa em BvS é a deturpação do sonho americano, enquanto Superman é o próprio. Ele é a verdade e a justiça. Batman é definitivamente oposto disso. Um, está para se tornar, enquanto outro, deixou de ser há muito tempo. Estas são as diferenças entre os dois, não apenas uma comparação superficial – a qual funciona – sobre luz e escuridão. Batman tenta matá-lo, Superman tenta conversar com ele. Ele discorda de seus atos, mas não quer lutar contra ele.

Falamos bastante sobre Superman, política, Luthor e Batman, mas esquecemos de Lois Lane. Provavelmente a segunda personagem mais importante deste universo. Justamente pelo fato dela ser a ponte entre Ka-El e Clark Kent. Lois é a responsável, não apenas por resolver a conspiração, mas por desbloquear a humanidade do Superman. Enquanto ele carrega o mundo sob as costas, ele precisa se apoiar em algo para acreditar em seus ideais: Ela.

Lane é sempre a primeira a ser salva, pois ele tem noção do que acontecerá se ele um dia perdê-la. Pode soar egoísta, mas não é. É apenas uma forma do Superman continuar a fazer o certo e não duvidar de suas escolhas. É como uma proteção. Uma chave, para ser mais exato. Por isso, ele associa o mundo a ela.

Por último, não podemos deixar de falar sobre um tema central nesta trilogia: Vida e morte. Nesses três filmes o homem brinca de deus. Em O Homem de Aço, é o conselho de Krypton e em Batman vs Superman, Lex Luthor. Ele dá vida ao Apocalipse, a criatura criada para matá-lo. A artificialidade versus a naturalidade. Mesmo tendo sido espancado, odiado, humilhado e manipulado, ele se sacrificou por este planeta. Logo após sua morte, o mundo percebeu o seu verdadeiro significado: “Se procura por um monumento, olhe ao seu redor.” Infelizmente era tarde demais.

[O texto será atualizado após o lançamento da Liga da Justiça do Zack Snyder]

 

Por João Guilherme Fidelis

"Mas sabe de uma coisa ? Sentir raiva é fácil. Sentir ódio é fácil. Querer vingança e guardar rancor é fácil. Sorte sua, e minha que eu não gosto deste caminho. Eu simplesmente acredito que esse não é um caminho" - Superman (Action Comics #775)