Tony não costuma brincar na rua, tem um único amigo e uma aparência que faria qualquer garota tomar distância considerável dele. A maior diversão encontrada por ele é se fechar em seu mundo alimentado por seus brinquedos, quadrinhos e filmes de terror que precisa assistir escondido de seus pais. Criado em sua própria bolha, começa a ter dificuldades quando esta estoura e passa a respingar na vida real que, para ele, apresenta sempre fortes referências à sua bagagem cultural.
Assim, temos quase 100 páginas de quadrinhos que revivem casos clássicos que fazem parte do cotidiano norte-americano. Mas aqui, no lugar da falsidade dos vizinhos e urina dos convidados para o churrasco de fim de semana, a piscina guarda um segredo que só se vê no cinema trash, a babá irresponsável pode se arrepender de não seguir à risca sua chance de dinheiro fácil e os pais de Ricky Bellows teriam uma formidável companheira para o chá da tarde caso Pamela Voorhees quisesse compartilhar as peripécias de seu querido filho Jason.
Charles Burns desde cedo já despontava como um mestre do chiaroscuro. Sua arte ao mesmo momento que resgata o clássico, se torna atemporal. Burns já estava pronto em seu traço, mas não em seu roteiro. As histórias de Big Baby são medianas comparadas ao que se veria em Sem Volta ou Black Hole, este último claramente o resultado final da ideia que começou no tomo Peste Juvenil de Big Baby onde, assim como em Black Hole, uma doença é transmitida entre adolescentes através do sexo.
Tony é a bizarra encarnação das aventuras de seu autor quando jovem. Seus medos, a descoberta dos quadrinhos, os prazeres e perigos da leitura de material impróprio para sua idade, a curiosidade de descobrir por que era diferente dos seres mais velhos… Tudo está ali e nos brinda com o que muitos já passaram nessa idade. Inclusive quem agora redige esse texto. Apesar de tudo, a passagem de Tony pelo papel foi curta: Seu pai o criou para apenas 4 histórias entre 1983 e 1991. Se considerar a primeira somente introdução, podemos dizer que foi apenas trilogia. Big Baby teve uma morte prematura.
Poucos vão lembrar, mas essa não é a primeira vez que Big Baby aparece no Brasil: sua primeira história de apenas duas páginas foi publicada na revista Animal nº1 da editora VHD Diffusion em 1988. Agora, a Darkside nos traz em edição única todas as aventuras do garoto com feições que misturam um lagarto e o clássico Pinduca compilada em livro de capa dura com comentários do autor e extras.
Big Baby satisfaz a quem sente saudades de quando tinha entre 7 e 14 anos. Período perigosamente saudosista que insiste em não sair de nossas memórias e atitudes. Somos moldados justamente nesse período e, se tivermos as mesmas desventuras que Tony, as cicatrizes podem ser eternas.