“Àqueles que disseram: ‘tenham paciência, esperem’. Há muito dizemos que não temos como ter paciência”
(John Lewis)
Exatamente sobre isso que A Marcha – Livro 2 retrata. Não há como mais se ter paciência. Não tem como mais esperar. A publicação segue os acontecimentos da primeira edição, que você pode ler mais detalhes AQUI, e percebemos que ela é um tanto mais tenebrosa e assustadora historicamente do que a sua antecessora. Continuando com a narração do parlamentar norte-americano John Lewis, o sonho do fim da segregação racial nos EUA, continua em fatos pesados e violentos. Em edição completamente recheada de momentos que embrulham o estômago, A Marcha – Livro 2, se torna uma aula de história, onde busca ensinar que a luta do passado reflete na liberdade que se tem no futuro.
Se no primeiro volume, temos uma espécie de “romantização” de um jovem buscando lutar por direitos básicos para a sua raça, como por exemplo, sentar-se em uma lanchonete, com um tom até que leve e esperançoso que abraça o leitor. A Marcha – Livro 2 chega com dois pés na porta. Sendo forte e necessário nos relatos que estão nele. E são atos que refletem muito no momento em que os EUA, e incluo que o Brasil também está enfrentando, por causa de seus líderes controversos. Nessa edição temos pais incitando os filhos a espancarem os negros. Temos governantes recém eleitos, em seus discursos de posse, alimentando o ódio e o preconceito contra raças. Temos políticos usando de ideologias políticas, que são contra e homofobia para menosprezar, perante a opinião pública, seus adversários que lutam pela liberdade e igualdade. A infinidade de violência policial também faz presente.
No segundo volume, John Lewis, com 23 anos, é eleito presidente do Comitê Coordenador Estudantil Não-Violento, alcança os holofotes e se torna um dos líderes do Movimento pelos Direitos Civis, conhecidos como os Grandes Seis. O transformando em um dos principais nomes da histórica Marcha sobre Washington por Trabalho e pela liberdade em 1963. Figuras como Malcolm X, A.Philip Randolph, Bayard Rustin, Robert F. Kennedy, o presidente John Kennedy e, claro, Martin Luther King Jr. estão presentes nessa edição.
Os relatos de John Lewis roteirizados por Andrew Aydin, são impactantes e transbordam uma genial mistura de biografia do parlamentar com a brutalidade das lutas e politicagem pelos direitos civis. Nessa edição acompanhamos como muitas figuras importantes já não consideram que os meios sem violência não são mais tão eficazes assim, fazendo Lewis testemunhar uma mudança, até um tanto lenta e gradativa, dos pensamentos de alguns de seus companheiros e da juventude negra em si. É tipo aquela velha máxima infeliz da humanidade: alguém luta para alguém usufruir. Mas quem acaba usufruindo não dá o devido valor de como essa luta aconteceu.
Vale destacar as páginas de reuniões e discursos presentes em A Marcha – Livro 2. O que pode ser maçante e cansativo na linguagem dos quadrinhos, se torna prazeroso e visceral graças aos traços do artista Nate Powell. As palavras parecem que saltam das páginas e as expressões dos personagens, proporciona a sensação de que podemos ouvir o peso das palavras. Assim como podemos sentir os momentos em que a violência explode. Duas cenas ficaram muito fixas na minha memória: a da turba sulista que entra em confronto com os negros, e uma mãe pede para o filho espancar um negro caído e, em outro conflito, quando um policial branco para em frente à uma garotinha negra e agacha para conversar com ela. São dois momentos fortes, em que Powell transmite emoção nos seus traços.
A edição da Nemo é um luxo à parte. Por várias vezes temos músicas durante a história que estão na forma original, em inglês, nas páginas. Mas no rodapé vem a tradução. Ainda conta com o discurso original de John Lewis que foi realizado na Marcha em Washington. A tradução é do Érico Assis. Já estamos ansiosos para a terceira e última edição.
A Marcha – Livro 2 tem formato 23,8 x 16,8 cm, 192 páginas e é uma trilogia vencedora do Prêmio Eisner.