Quando uma série conhecida retorna de seu longo hiatus, os fãs comemoram como se fosse final de ano na praia. A rotina ganha novos ares e o marasmo vai embora. Cada semana se torna um pequeno ritual para assistir o episódio e depois comentar nas redes sociais. E quando acontece o contrário? A nova temporada chega de mansinho, ninguém comenta e não recebe a atenção necessária. Quem é o culpado pela frustração? O próprio fã ansioso ou a equipe interna?
De qualquer forma, estou aqui para falar de Black Mirror. Sabe, aquela série distópica que apresenta inúmeros casos como a tecnologia pode nos afetar profundamente? Então, parece-me que a produção da Netflix está meio perdida em reencontrar o seu valioso tom que definia a sua grande matriz: Refletir através do choque.
[CONTÉM SPOILERS ABAIXO]
Striking Vipers trouxe Anthony Mackie e Yahya Abdul-Mateen II como dois amigos que descobriram o amor através de um jogo moderno, onde ambos podiam interagir dentro daquela realidade virtual. Este foi um tema interessante de se retratar, porém não trouxe aquele fator chocante para a trama. Nos faz pensar? Sim, mas de um jeito aquém do esperado. Não é aquela parada que você fica durante minutos fitando a tela do seu notebook e tentando encontrar palavras para definir essa viagem de 1 hora. Tampouco foi um aceno sobre o vício e como esta prática afeta o usuário, assim como todos ao seu redor.
O episódio não precisou ir mais a fundo para definir a orientação sexual dos personagens por conta deste ato e essa ideia foi bacana. Não era necessário colocar Danny e Karl discutindo se eram héteros, bis, g0ys ou seja lá o que for. A grande surpresa ficou com o consenso criado para que todos fossem felizes. Não criou-se uma relação de aparências. A relação prevaleceu. Só que novos itens foram adicionados nessa equação complicada chamada casamento.
O episódio seguinte já nos trouxe um caso mais comum e pé no chão. Junto com uma crítica social que já estamos familiarizados dentro da própria antologia de Black Mirror. Lembram de Nosedive (3.01) com Bryce Dallas Howard? Então, a mensagem foi melhor repassada aqui do que em Smithereens. Assim como o anterior, ele não causa choque ou repulsa por algo. O personagem principal, Chris, não queria cometer nenhum crime. Apenas queria ser ouvido pelo Big Boss da rede social responsável por transformar a vida dele em pura depressão pela morte de sua noiva.
O mais surpreendente é a causa do acidente e expõe de forma pontual o que estamos vivendo atualmente. Nós (Sim, me incluo nessa de vez em quando) ficamos tão conectados em nossos aparelhos eletrônicos como se tivéssemos com uma espécie de viseira invisível nos lados, que não percebemos as coisas que acontecem ao nosso redor. Perdemos coisas por estarmos flexionando o pescoço para baixo atualizando o celular com novas mensagens ou aplicativos que nos permitam interagir cada vez mais com as pessoas. Pinóquio já dizia: No strings on me!. Será que podemos dizer o mesmo?
E para finalizar a temporada mais curta que o normal, tivemos Rachel, Jack and Ashley Too. Claramente o mais divertido que também trouxe um realismo misturado com o toque básico que a série oferece quando quer. O que parecia uma crítica ao fanatismo de fã, acabou se revelando como a vida de uma artista jovem é destrutiva e corrosiva quando você tem pessoas ao seu redor que agem por benefício próprio.
Miley Cyrus e Angourie Rice estavam ótimas em seus respectivos papéis. Conseguindo então transmitir os principais sentimentos que jovens passam durante essa fase como medo, ansiedade e depressão. Seguindo os demais, este não trouxe um choque ou algo similar para o seu público. Porém, foi tão gostoso de assistir que você esquece qualquer contragosto e apenas se diverte como se estivesse assistindo aquele filme na Sessão da Tarde.
Diante disso, será que estamos presenciando o desgaste de Black Mirror nas mãos do canal de streaming? Muitos já se encontram insatisfeitos com o trabalho realizado desde que saiu da BBC e isso traz um alerta: A tendência é continuar deste jeito com o pretexto de apresentar histórias mais leves, porém que ainda se encaixem na proposta. Ou numa possível sexta temporada, oremos todos, que a equipe criativa retorne com ideias absurdas e surreais, fazendo que os telespectadores recuperem a confiança e digam novamente: Isso é tão Black Mirror!