Como sabemos temos diversos guerreirinhas e guerreirinhos dos quadrinhos nacionais. Muitas vezes na força, no suor, na raça e um tanto de sangue e lágrimas. Já estamos caminhando ao final do segundo ano de uma pandemia e essa galera, que muitos são nossos amigos, passaram por alguns perrengues sem os tradicionais eventos e no meio de tantas e tantas opções de quadrinhos para os leitores brazucas. E a galera foi buscar meios e modos para não deixar a bola da criação cair.
Uma das formas foram as campanhas de financiamento coletivo, fosse para financiar as próprias publicações ou para levantar suas campanhas de assinaturas. E esse é o ponto importante. As assinaturas no Catarse e no Padrim são meios, não só dos quadrinhos, mas de outras mídias como podcasts ou sites, de ajudar a manter viva um trabalho bacana e decente.
Obvio que existem veículos e quadrinhos que não merecem um centavo, mas esse não é o foco. E também sabemos que nem sempre dá para ajudar todos os amigos. A situação financeira não está fácil para ninguém (exceto para alguns engravatados aí no poder), mas podemos é pegar alguma assinatura, que converse mais com a gente, que curtimos mais e que queremos ver o trabalho sempre funcionando.
Além de contribuir com o movimento, ou cena, ou trabalho de um quadrinista, as assinaturas ainda possuem um sistema de recompensas. Podem ser conteúdos exclusivos, artes, fazer parte de grupos privados no Telegram ou então no Facebook e newsletter com novidades e notícias.
Uma gama maior de projetos você pode encontrar no Catarse e no Padrim.
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Hoje, dia 30/01, é Dia do Quadrinho Nacional, grande parte da produção dos quadrinhos no Brasil é realizada por pessoas que se desdobram em mil com empregos, família etc… para poder dar a sua contribuição a essa arte. E nesse longo caminho dos quadrinhos brazucas, surgiram muitas pessoas que são pilares e cravaram seus nomes, seja com suas contribuições, ou seus discursos e lutas para melhorias para cada um poder publicar sua arte. E uma dessas pessoas é Cadu Simões.
Cadu Simões é autor de gibis lendários como Homem-Grilo e Acelera SP, e sempre de alguma forma esteve presente na cena dos quadrinhos, produzindo, em conversas, eventos ou em bate-papos no icônico Bar do Simões, local capitaneado pelo seu querido pai, que fica em Osasco. E enfrentando uma luta contra o reumatismo que muitas vezes o impede de produzir.
Nessa conversa falamos um pouco sobre como promover a produção de quadrinhos desvinculando noção de mercadoria, a cena de agora com de antigamente, o momento político/econômico do país e como afeta a nona arte e uma dúvida de todo fã: “Seria o Cadu Simões o Homem-Grilo?”
1. O que você está lendo atualmente?
Atualmente estou lendo apenas livros teóricos para faculdade de Letras, que voltei a cursar, depois de ter trancado ela em 2013 por causa do meu reumatismo. Mas assim que eu entrar de férias, pretendo retomar a leitura da minha pilha de quadrinhos que só cresce.
2. Você tem uma interessante ideia de promover a produção de quadrinhos que desvincule a noção do produto como mercadoria a ser vendida num mercado visando a acumulação de capital. Pode dar mais detalhes dessa ideia?
A história em quadrinhos surge, como toda arte, como a poesia, a música, a pintura, não como um produto a ser vendido e comercializado, mas como uma obra a ser apreciada e desfrutada. Mas no século XX, com a criação do formato de revistas em quadrinhos, principalmente dentro do modo de produção e distribuição industrial das grandes editoras, a maioria das pessoas passaram a encarar os quadrinhos apenas como produto e mercadoria e que vai culminar no colecionismo, muitas vezes feito por pessoas nem mesmo leem essas HQs, e apenas ficam exibindo-as na estante.
É como se a obra quadrinhos não existisse mais sem a mercadoria quadrinhos. Mas assim como a música existe sem o produto disco ou CD, os quadrinhos podem existir sem o produto revista ou livro, seja físico ou digital. Então nos meus quadrinhos eu estou tentando um modo de produção e distribuição anticapitalista que vai na contramão do que vem sendo feito tradicionalmente, mesmo nos quadrinhos independentes, desvinculando ao máximo os quadrinhos como mercadoria.
E isso é feito principalmente publicando-os sob uma licença livre Creative Commons, que permite que qualquer um possa copiar, compartilhar e redistribuir minhas obras em qualquer suporte ou formato, assim como transformar, remixar e criar outras obras a partir das minhas, mesmo que para uso comercial, desde que seja dado o crédito apropriado aos autores, que seja indicado a fonte das obras, e que qualquer obra derivada seja distribuída sob a mesma licença, dessa forma promovendo um ciclo virtuoso de cultura livre.
A produção das minhas HQs são financiadas por financiamento coletivo recorrente e são publicadas online, nos sites de cada respectiva série em quadrinhos, de forma gratuita para a leitura de todo mundo, e não apenas para os apoiadores. Afinal, apesar de não existir almoço grátis, uma vez que o almoço foi pago e produzido, porque não compartilhar com os outros? Ainda mais quando esse almoço pode ser copiado e reproduzido infinitamente sem a perda ou o esgotamento de cada cópia.
O objetivo é que seja priorizado pelos leitores o valor de uso dos quadrinhos como objeto artístico e cultural, e não seu valor de troca como mera mercadoria. Assim, todos podem se sentir vontade para ler, compartilhar, imprimir, distribuir e criar obras derivadas a partir das minhas HQs.
3. Muitos consideram você, digamos, uma “velha guarda” dos quadrinhos nacionais. Ao seu ver, tirando a tecnologia, o que mudou de melhor para que produz quadrinhos no Brasil?
Acho que as duas principais mudança para melhor nos últimos 20 anos, desde que comecei a fazer quadrinhos, foi, primeiro, o aumento na quantidade de eventos de quadrinhos com espaço para quadrinistas. Hoje em dia alguém que está começando e acabou de fazer seu primeiro quadrinho, pode ter uma mesa para vendê-lo em grandes eventos como o FIQ em Belo Horizonte, a Bienal de Quadrinhos em Curitiba, ou a CCXP em São Paulo. Quando comecei isso para mim era impossível.
E segundo, o surgimento das plataformas de financiamento coletivo, como o Catarse, que permitiu o financiamento de várias obras em quadrinhos de forma independente, em que talvez não veriam a luz do dia nem em editoras.
4. E invertendo a pergunta: o que piorou?
O que piorou foi certamente o encerramento de diversos programas e políticas públicas federais que ajudaram a fomentar não só os quadrinhos, mas o mercado editorial como um todo entre 2003 até mais ou menos 2015. Hoje não existe mais nada disso. O governo Temer começou a cortar vários desses programas, e o governo Bolsonaro terminou de acabar com tudo (e acabou com o próprio Ministério da Cultura). Espero algum dia podermos ter novamente um governo federal que fomente não só o mercado editorial, mas a cultura como um todo.
5. No meio de um país que estamos enfrentando uma corja/onda fascista, e que chega em todas as mídias, inclusive as HQs, eu acho que devemos sair da nossa bolha de conhecimento, e apresentar para outros públicos os ideais. Na sua visão qual é a melhor forma de sair dessa bolha? Com uma obra direta (tipo pé na porta) ou com mais sutileza?
Acho que não tem um modo correto. Eu mesmo tenho quadrinhos no qual a mensagem política antifascista é mais sutil, como o Homem-Grilo, e outros em que a mensagem é mais direta e escancarada, como Acelera SP. O importante é o quadrinista se posicionar contra o fascismo, pois não dá pra ficar neutro diante dele.
6. Uma bebida para a hora da leitura?
Chá é sempre uma boa opção.
7. Tirando o Homem-Grilo & Sideralman, que são os xodós, qual obra você tem aquele lugar mas quentinho no coração e porquê?
Acho que é Acelera SP. É a minha obra mais difícil de ser escrita, a que mais me exige pesquisa, mas é a que mais me dá retorno de leitores nos últimos tempos. Muito disso acontece, creio, pela atual fase política que vivemos.
8. Como a vida pessoal do Cadu Simões conversa e se mistura com as suas próprias obras? Você seria o Homem-Grilo?
Não, não sou o Homem-Grilo. Mas ele tem muitas características de alguns amigos de infância meu. É nesse aspecto que minha vida pessoal conversa e se mistura com minhas obras. Sempre acabo incluindo elementos da minha vida nas minhas obras, ainda que muitas vezes de forma sútil e nem sempre direta.
9. Quais os próximos trabalhos?
Eu tenho escrito três novas histórias, mas que não sei exatamente quando começarei a publicá-las, pois nenhuma delas tem ainda desenhista. Então por hora não tenho como falar mais sobre elas. Mas pretendo continuar publicando novas HQs dentro das minhas séries já existentes, como o Homem-Grilo, Nova Hélade, Cosmogonias e Acelera SP. E como sempre, tudo gratuito na internet sob Creative Commons.
Para poder ler os quadrinhos do Cadu Simões e acompanhar todo o seu trabalho, clique AQUI.