Lá pelo ano de 2018, rolou o lançamento de uma HQ que seria a catapulta para a carreira de um dos grandes e mais promissores nomes da cena dos quadrinhos nacionais. Entrespaço, após uma campanha bem sucedida de financiamento coletivo no Catarse, era lançado finalmente durante o 10º FIQ – Festival Internacional de Quadrinhos. E a história do astronauta que está solitário na Lua, enfrentando seus próprios demônios no meio da maior realização de sua vida, ganhou fãs por todos os lados.
E agora Entrespaço está de volta.
O autor Daniel Sousa está trazendo de volta completamente redesenhada e com o dobro de páginas da edição original, além de extras como pinups, rascunhos e mais alguns textos especiais para esta edição. Com praticamente o dobro de páginas do original, em preto e branco e tons de cinza. E com alguns momentos coloridos.
Daniel sempre falou que Entrespaço é uma obra com questões autobiográficas. E ela reflete muitas questões existenciais que ele passava na época. E o mais interessante é que o leitor é bem capaz de se ver no mesmo estado daquele astronauta lá na lua. Como esse que escreve se viu na mesma posição. Você pode conferir AQUI a nossa resenha.
Entrespaço voltou em uma nova campanha no Catarse e para saber mais sobre a campanha, recompensas e claro para apoiar, clique AQUI.
Nos últimos anos, editoras de quadrinhos tem surgido no mercado e recebendo destaque no cenário nacional. E uma delas é a Skript Editora. Com uma proposta de usar campanhas no Catarse para iniciar as pré-vendas de suas publicações, a Skript encheu seu quadro de publicações com coletâneas importantes com diversos quadrinistas nacionais e histórias publicadas na gringa.
E agora também chegou o momento de olhar mais para as publicações independentes do Brasil. Pensando nisso a Skript Editora anunciou uma série de lançamentos de HQ’s que fizeram e fazem sucesso no digamos, underground dos quadrinhos, e está junto com os artistas na distribuição. Vamos conhecer algumas delas:
Entrespaço – Daniel Sousa
O que você faria se fosse enviado para a Lua em uma solitária missão de resgate? Como lidaria com a pressão se precisasse lidar com seus próprios demônios enquanto alcança a maior realização de sua vida? Algumas destas perguntas você encontra em ENTRESPAÇO, uma HQ que acompanha a jornada de um astronauta em sua primeira viagem ao desconhecido.
Lâmina Azulada – Luíz Carlos Sousa e Rafael Dantas
Euclides é um velho cangaceiro que, após sepultar seu último colega, o cão Curió, recebe a visita do barqueiro dos mortos, Severino. A entidade lhe oferece realizar seus desejos se Euclides ajudá-lo a tomar o reino do pós-vida, mas, cansado de pelejas, o ancião nega o convite. Tomado pelo ódio, Severino fecha seu barco ao cangaceiro: “Não morra nunca”. Consumido pela doença e pelo tempo, Euclides inicia uma jornada em busca da mítica Lâmina Azulada, artefato que poderá lhe ajudar a reclamar seu direito de morrer.
Antologia Opera Sopa – Diogo Pavan
Opera Sopa é uma saudosista antologia sobre dilemas humanos em uma roupagem de fantasia e ficção científica. Com uma linguagem retro-futurista ela não se restringe a estilos e gêneros ao contar histórias, sua arte se transforma em prol de emular uma das principais características das clássicas antologias vanguardistas, a experimentação da narrativa na arte sequencial.
De Passagem – Luciano Ribeiro e Luan Zuchi
Mãe e filha vagam pela vastidão do oeste. Às vezes a noite é trazida por um mal que nunca finda. Tal noite cai sobre uma fazenda isolada. Que história ela nos contará?
Tachyon – Daniel Sousa
Listada pela Super Interessante como uma das “5 HQs nacionais de ficção que você precisa conhecer na CCXP19”. Com o primeiro contato extraterrestre iminente, acompanhamos duas pessoas que revisitam seu passado, presente e futuro, exorcizando demônios pessoais. Psicodelia, instrospecção e pitadas autobiográficas que podem ou não ser verdade.
Veludo dos 9 Infernos – Parte 1 e 2 – Bruno Brunelli, Lula Carneiro e Nivio Domingues
Há mais de 3.000 anos, em meio à dureza da vida, em que o principal objetivo era apenas a sobrevivência do grupo sem considerar suas individualidades, nasce uma criança altiva e inteligente, sedenta de desejo pela vida, descobrindo que viver era o maior dos prazeres, e que não havia preço para isso. Cresceu endurecido pelo fogo, pelo deserto e por onde andava espalhava o terror, sangue e dor – e nem a morte conseguiu impedir! HQ baseada na história de vida narrada pelo Exu Veludo e psicografada por Nivio Domingues.
Bar do Pântano – Felipe Tazzo e Daniel Sousa
Indicada ao Troféu Angelo Agostini (2018, como melhor lançamento independente) tem uma premissa no mínimo interessante: “E se você fosse parar no inferno? E se lá não fosse assim tão ruim?”
Graffic Noire Jersey – Immigrant
Jack é um novato no jogo perigoso e estiloso dos assassinos profissionais. Julian é um veterano em posse de uma maleta cujo conteúdo pode desequilibrar a hierarquia do crime em Chinatown. A missão é simples: matar Julian, recuperar a maleta e sair vivo dessa. Confira aqui nossa resenha sobre Graffic Noire Jersey.
Importante estes trabalhos chegarem em muitas pessoas, que a Skript Editora continue com essa iniciativa e juntamente com os autores, que venham mais e mais publicações.
O mercado de quadrinhos brasileiro vem se consolidando cada vez mais nos últimos anos, principalmente quando pegamos a área independente do nicho, vemos que novos escritores e desenhistas surgiram com ótimos trabalhos. E suas publicações têm ido de vento e popa. O que é o caso do Daniel Sousa.
O Daniel Sousa é morador de Campinas/SP, é designer gráfico e ilustrador, e encarou o desafio de publicar suas HQS em 2018, quando lançou a hqs Entrespaço e O Bar do Pântano. Como um verdadeiro Homem-Polvo, ele fica em diversas frentes com os mais variados projetos: é o artista das webcomics Niilismo Apologético e Rascunho do Inferno, capista do zine do podcast Benzina, está em campanha no Catarse com Histórias para (NÃO) Dormir, esse ano ainda começam mais duas campanhas: Antologia VHS e Tachyon (que você pode conferir uma prévia no site Tapas), é presença confirmada no Artist Alley da CCXP 2019, fica de frente à loja virtual do Cavernna e ainda encontra tempo para ser paizão de quatro crianças. O homem não para, mesmo assim conseguimos trocar uma ideia com ele para o Dá o Papo Comics:
1 – A campanha no Catarse de Histórias para (NÃO) Dormir é um sucesso (até aqui já estava com 98%). Como surgiu a ideia e o convite para participar dessa antologia?
Daniel:O bacana desse projeto é justamente a vontade de quadrinistas iniciantes de enfiar as caras na produção de quadrinhos. A ideia veio de uma conversa entre o Lucas e o Rafael em um grupo de discussão, e em pouco tempo eles já tinham organizado tudo. A inspiração na obra do Lovecraft foi o ponto em comum entre os autores, e daí o projeto caminhou. Além disso, foram feitos alguns convites para pessoas que já tem um nome estabelecido nas hqs, como o Eric Peleias, Edson Bortolotte, Ede Galileu, e isso foi muito importante não só para ajudar a chamar a atenção do público, mas também para estimular os novos artistas. Essa vontade de colaborar só reforça o que costumo afirmar: Que a comunidade de quadrinistas independentes aqui no Brasil é muito unida. Eu fui convidado meio que em cima da hora para participar do projeto. O artista que inicialmente ilustraria o roteiro do Eric precisou se afastar do projeto, e foi nesse momento que eu fui convidado. Eu já conhecia o Lucas, e ele já havia me convidado anteriormente, mas eu não pude aceitar por estar envolvido em outros projetos, mas o segundo convite bateu certo com o meu cronograma, e eu fiquei feliz em conseguir colaborar.
Tenho ajudado também com a experiência que tive com minhas hqs no Catarse para ir arredondando as pontas da campanha, mas o mérito é todo deles, eu só faço o spam. Mas sim, alcançar praticamente os 100% da meta antes da metade da campanha é um feito bem bacana, e a intenção é continuar arrecadando para oferecer aos leitores ideias que ficaram inicialmente de fora por motivos de orçamento. Então quem está acompanhando o projeto pode esperar metas estendidas com algumas novidades, incluindo uma hq extra com um roteirista experiente e um quadrinista novo, mas espetacular! E pra quem ainda não apoiou, sugiro que dê uma passada na página da campanha no Catarse. Muita recompensa bacana, inclusive um pacotão de hqs anteriores dos artistas envolvidos e arte original.
2 – A história O Chamado de Deus é sua com o roteiro do Eric Peleias. Como foi essa dobradinha e o que pode adiantar da história?
Daniel: O roteiro do Eric é – e não podia ser diferente – excelente. Por se tratar de histórias curtas (7 páginas), espera-se pouco espaço de manobra para se contar uma boa história, e o Eric contornou isso com maestria. Sem abrir mão do horror e suspense, a trama é bem costurada e tem uma carga dramática que dificilmente alguém conseguiria desenvolver em uma narrativa curta como esta.
Tanto o Eric quanto eu estamos em cronogramas individuais apertados, e eu ataquei o roteiro já finalizado. Mas justamente pela qualidade das direções do Eric no roteiro, pude ilustrar as páginas de uma vez só. Mantivemos nossa comunicação mas tudo foi resolvido sem muitas intervenções de um lado ou de outro, e fiquei contente com o resultado. E mais importante para mim, o Eric também.
Sobre a história em si, sem entregar os spoilers, se passa em um hospital psiquiátrico e tem como ponto central os limites entre a loucura e a sanidade – tema sempre presente na produção de Lovecraft. Dizer mais do que isso já é entregar a história.
3 – A gente vê uma galera seguindo muito na vibe de H.P. Lovecraft. O quadrinho nacional bebe muito dessa fonte, o que é natural, pois Lovecraft foi um gênio sem sombra de dúvidas. Quando surgiu a ideia de Histórias para (NÃO) Dormir, rolou algum receio do tipo: “ah mais uma HQ sobre isso” ou se tornou um desafio de fazer algo diferente do que já tinha sido apresentado?
Daniel: Sem dúvidas, a obra do Lovecraft é um tema que sempre foi muito explorado pelos autores de horror e suspense. Com a maioria de suas obras passando para domínio público essa produção só aumentou, e isso tem seus lados bons e ruins. Se por um lado pode parecer um atalho rápido para se produzir material de horror, por outro é um bom ponto de partida e sempre um porto seguro. O fato é que a produção de ficção costuma passar por fases: vampiros, zumbis, worldbuilding medieval, cyberpunk… Acho que o que vale é o mérito do autor em desenvolver uma boa história e tentar se destacar no meio de tantas publicações.
Além disso, é um conteúdo que tem seu público cativo. Se não houvesse saída para esse tipo de material, certamente não veríamos tantas publicações do gênero. Então a questão não é se perguntar “ok, vou fazer mais uma hq sobre esse tema?”, e sim “ok, como posso contar uma história bacana sem cair no lugar comum?”. E sob essa ótica, eu acredito que tivemos sucesso.
4 – O Catarse é uma baita plataforma para artistas independentes e até editoras. E ultimamente temos visto muitas campanhas, principalmente de julho para cá. Como agir para uma campanha não “canibalizar” outra?
Daniel: Antes de mais nada é preciso ressaltar que eu sou cria justamente dessa geração do crowdfunding, hahaha. Da publicação de Entrespaço no ano passado até o final deste ano terei participado de pelo menos 6 campanhas, então esse é o único caminho que utilizei para conseguir publicar minhas hqs.
Eu vejo o financiamento coletivo como um grande marketplace para quadrinistas independentes. Conheci o trabalho de muita gente ao navegar pelas campanhas em andamento, da mesma maneira que há 20 ou 30 anos eu folheava títulos em bancas em busca de algo para ler, e sei que muitos dos meus apoiadores chegaram até meus títulos dessa mesma maneira. Então eu simplesmente não tenho como achar ruim que haja cada vez mais títulos disputando apoio. Isso é sinal que há cada vez mais gente com possibilidade real de ter seu trabalho publicado. O aumento no número de projetos no segundo semestre é algo natural. A CCXP acontece em Dezembro, e é o evento mais visado pelos quadrinistas, então uma concentração de novos projetos nesse período é inevitável já que o processo de seleção prioriza artistas que tenham algo de novo para o evento. Este ano, especificamente, não tivemos o FIQ ou a Bienal de Curitiba para dar vazão a lançamentos ainda no primeiro semestre, então isso influenciou ainda mais. Talvez não seja o ideal, mas estamos longe de estar em uma situação complicada. Ano passado financiei a publicação de duas hqs, uma no primeiro e outra no segundo semestre. A quantidade de apoiadores foi praticamente a mesma. Então eu não quero apresentar uma solução definitiva para essa situação, mas talvez a questão não seja a do autor disputar um possível apoiador com outros autores, e sim pensar em como trazer novos leitores para esse mercado, independente se a campanha acontece em Maio ou em Setembro.
Mas claro, existem outras soluções. O apoio recorrente é uma delas, e nos últimos meses tenho estudado e me preparado para utilizar essa variação de financiamento coletivo como maneira de disponibilizar meus títulos. Gostaria de já estar com isso no ar, mas ficará para o ano que vem.
Mas esse é um daqueles problemas que eu fico feliz em ter para resolver, hahaha. Pior seria se não houvesse esse tipo de plataforma e a produção precisasse ser bancada inteiramente do próprio bolso. Aí sim estaríamos ferrados, pois a quantidade de gente publicando de maneira independente é cada vez maior, e o alcance seria infinitamente menor. O crowdfunding é mais do que uma vaquinha para você bancar sua publicação. É uma ferramenta que cria todo um mercado de leitores. Vale a máxima: em tempos de crise, tem gente que chora e tem gente que vende lenço.
5 – Entrespaço foi a sua estreia nos quadrinhos. Ela tem um peso particular de um momento de sua vida. Já foi lançada até em inglês, sendo bem elogiada por várias pessoas. Como você vê Entrespaço ainda? Ela chegou onde você queria ou ainda pode alcançar voos maiores?
Daniel: Eu tento não olhar muito para ela hahaha. Sim, tive um retorno muito legal por parte do público com essa hq, e isso me deixa feliz porque o texto é bem pessoal, a metáfora do astronauta é meio que o meu manifesto em forma de quadrinhos.
Artisticamente falando? Foi meu primeiro trabalho em arte sequencial, e se por um lado eu gostei do resultado estético, do outro a narrativa visual me incomoda. E o meu traço estava bem cru nesse trabalho. Tenho consciência que evoluí de lá para cá, mas ainda preciso melhorar bastante alguns aspectos do meu desenho.
Para um primeiro trabalho, acho que ela chegou inclusive mais longe do que eu imaginava. O lançamento no FIQ 2018 foi excelente – foi meu primeiro evento, lançando minha primeira hq – e até hoje encontro leitores que me puxam de lado para contar o quanto se identificaram com a publicação.
Hoje estou com a tiragem dessa hq quase esgotada (espero que sobrem algumas edições para a CCXP19), mas ela está disponível em formato digital na Comixology em inglês (como Interspatial) e português.
6 – Você está presente na Antologia VHS, que reúne uma galera muito boa e está sendo bem aguardada. O que poderia adiantar sobre VHS e sobre a sua história?
Daniel: Cara, poder participar da VHS com esse tanto de gente boa é uma honra pra mim. Para quem não conhece o projeto, é uma coletânea com quase 300 páginas de quadrinhos, organizada pelo Rodrigo Ramos e pelo Fernando Barone e a ideia é homenagear a trasheira dos filmes de terror da década de 80.
A dupla conseguiu juntar uma equipe de primeira pra essa publicação, e eu fiquei chocado quando soube que iria ilustrar um roteiro do demente Victor Freundt, do qual sou fã incondicional. Aliás, eu estou verdadeiramente preocupado com o resultado dessa hq. O roteiro do Victor pega não em só uma, mas em pelo menos uma dúzia de feridas diferentes, e tem um desfecho monstruoso. Estou seriamente considerando contratar um guarda-costas com o resultado das vendas hahaha.
Falando sério, tem sido uma experiência muito boa trabalhar com o Victor nesse projeto. Em Entrespaço eu escrevi e desenhei uma hq. Com O Bar do Pântano e Histórias para Não Dormir, tive a oportunidade de trabalhar com roteiristas, o Tazzo e o Peleias, e foi um aprendizado pela dinâmica nova. Com o Victor, a diferença é que ele também é um ilustrador, e a dinâmica muda novamente no vai e vem das páginas. O aprendizado tem sido incrível.
7 – No final do ano passado, você e o Felipe Tazzo lançaram o Bar do Pântano. Quando voltaremos a visitar o bar no inferno?
Daniel: Este ano o Bar do Pântano foi indicado, para nossa surpresa, como um dos melhores lançamentos independentes de 2018 do Troféu Angelo Agostini, e não dá pra deixar isso passar em branco. Não levamos o prêmio, e esperamos novamente não levar em 2021, mas para isso precisamos publicar o próximo volume em 2020. Então SIM, veremos mais material. Os compromissos com as duas coletâneas e os dois títulos solo que eu me comprometi a lançar este ano acabaram adiando um pouco os planos, mas não confirmo e não nego que 2020 possa trazer uma surpresa ou outra. Desde que começamos a pensar nessa hq o Tazzo aproveitou para elaborar todo um universo que pudéssemos ter de base para futuras histórias, e foi nesse vai e vem de conversas pelo WhatsApp e um ou outro encontro movido à base de cerveja que a segunda história presente na revista surgiu.
Então o que temos é um monte de regras, situações, personagens e possíveis acontecimentos que estão fermentando em algum lugar obscuro de nossas mentes, e que em breve serão organizados para um próximo volume do Rascunho do Inferno, que é como carinhosamente decidimos chamar esse universo que criamos.
8 – E aquele papo de animação do Bar do Pântano que surgiu no Twitter?
Daniel: Pois é, temos uma animação em andamento! O Tazzo é um cara ambicioso e eu sou um mosca morta. Pense em Pinky e Cérebro. Os planos para esse universo não estão limitados unicamente às hqs, e isso é algo que o Tazzo tem em mente desde que começamos a conversar sobre esse projeto. A ideia sempre foi expandir isso para webcomics, podcasts, animação, literatura e qualquer outra mídia que a gente puder perverter o suficiente.
No caso específico da animação, no momento não estou tão envolvido com o processo quanto gostaria de estar. O roteiro gira em torno da primeira história da revista, e o Tazzo tem contado com a ajuda do incrível Daniel Ete, também conhecido como baixista do Muzzarelas, para desenvolver a parte visual da coisa. Mas é um processo demorado, e assim que os compromissos com essa pilha de quadrinhos que estou envolvido terminar, volto para dar uma força na animação (e nas outras frentes desse plano). Mas o que tenho visto de todo o processo já está deixando bem claro que vai ser algo insano.
9 – Recentemente, você publicou no Tapas, Tachyon – prologo. Com a descrição de ser uma “hq semi-biográfica que pode ou não conter elementos de verdade”. A HQ ainda vai entrar em campanha no Catarse, mas poderia adiantar alguma coisa sobre Tachyon?
Daniel: Tachyon é uma mistureba de autobiografia, misticismo, vidas passadas, referências artísticas que eu preciso colocar para fora do meu sistema e mais um monte de ideias malucas. Eu passo boa parte do meu tempo acordado absorvendo informações, seja através de notícias, conversa, terapia, twitter, o meu vizinho maluco que insiste em bater boca com o meu cachorro (spoiler: ele ainda não conseguiu ganhar uma discussão)… tem muita merda acontecendo nesse mundo e é um desperdício isso não ser aproveitado em uma boa história. A trama, no final das contas, é uma espécie de exorcismo pessoal. Não no sentido clássico – eu não escrevo terror – mas no sentido de resolver pontas soltas da minha vida, colocar isso em pratos limpos e poder seguir em frente. Então o que você vai ler, não cronologicamente, é uma história de nascimento e morte. Enquanto Entrespaço foi uma espécie de foda-se para interferências externas em minha vida, em Tachyon eu mando o mesmo foda-se para as interferências internas, ou seja, é hora de crescer e entender o quanto você mesmo é responsável pelas suas derrotas e suas vitórias. Mas se você me conhece, sabe que eu não vou fazer isso de uma maneira linear ou, sei lá, didática.
Acredito que seja um trabalho que vai atender aos leitores de Entrespaço, que pedem por mais material nessa linha, mas que ao mesmo tempo tem uma proposta diferente o suficiente para não parecer mais do mesmo. E sim, eu sei que não falei quase nada. É surpresa. Leiam o prólogo e partam do princípio que aquilo é só o comecinho.
10 – Você tem histórias autobiográficas, terror, “horror-fantástico-maluco” como Bar do Pântano… qual seria um tema ou gênero que você gostaria de abordar diferente desses? Algo mais político ou mais “faroeste”, futurista…
Daniel: Alguns temas eu prefiro trabalhar com um roteirista. Terror é um deles. Eu não me vejo escrevendo terror em um futuro próximo, acredito que ainda não consegui pegar o jeito para esse tipo de narrativa. Por isso, os meus 3 últimos trabalhos, que são nessa linha, contam com o roteiro de outras pessoas (e posso dizer que pelo menos mais um está nos planos para o ano que vem, já que fui pego de surpresa com um convite bem bacana). Se formos falar de quadrinhos que eu escrevo, aí sim tenho minhas predileções. Futurista, posso dizer que com certeza sim. Política? Claro, mas não no sentido panfletário. É preciso lembrar que política não é (ou não deveria ser) o jogo de poder que vemos em Brasília, mas sim defender ideais que contribuam para a sociedade. E isso pode ser feito tanto através de alegorias quanto numa abordagem mais direta. No final do dia, o que importa é você se sentir à vontade para escrever sobre o assunto.
11 – Eu acredito que estamos vivendo um momento muito bom nos quadrinhos nacionais. Diversos artistas talentosos, uma galera boa se abraçando para divulgação, até mesmo os chamados “grandes sites” têm olhado diferente para o movimento. Mas, uma vez o Aléssio Esteves me falou, e concordo com ele, que não seria uma Era de Ouro essa atual. Porque já tínhamos uma galera trampando antes, e trampando muito bem. O que você acha desse momento? É o momento certo para fazer quadrinhos no Brasil, que se tornará mais duradouro, ou é apenas uma fase que tem uma galera “surfando”?
Daniel: Cara, o momento atual é muito bacana. Minha carreira como quadrinista é recente, mas eu acompanho o cenário nacional a tempos, e a coisa só tem embalado. Mas eu concordo com vocês. Definitivamente estamos colhendo os frutos desse pessoal que praticamente pavimentou na marra o caminho para as hqs independentes. Hoje temos ferramentas de financiamento coletivo que não existiam a 10 anos, e isso facilita imensamente o processo de publicação. Redes sociais, grupos de discussão, tudo isso ajuda muito não apenas para mostrar o seu trabalho, mas também para se relacionar com outros quadrinistas e com o público. Tive muitos apoiadores nos dois extremos do país, um alcance que eu jamais teria se não fosse por essa facilidade. Mas todo o mérito é desse pessoal que está fazendo quadrinhos desde antes dessas ferramentas estarem disponíveis para a maioria do público. Esses sim são os verdadeiros heróis.
“Mas, sinceramente, valeu a pena? Grande merda, passar por anos de estudos, testes, simulações, se você mal tem a chance de apreciar as estrelas. Caras, vocês foderam com tudo espetacularmente.”
Todos nós temos um sonho. Muitos perseguem para realiza-los. Alguns deixam pelo caminho. E quando você finalmente realiza, mas as pessoas o fazem parecer banal, simples como se não fosse nada de mais? Essa é a principal bandeira de Entrespaço de Daniel de Sousa. Transvestida na trama de um Astronauta, a HQ faz você pensar na vida. No que você realizou no que pode realizar, se valeu a pena todo o esforço e se deixamos as influencias de fora diminuir o que você realizou.
Desenhada e escrita por Daniel de Sousa a partir de um conto que o autor fez em 2011, a trama de Entrespaço, tem a Lua como cenário, um Astronauta precisa recuperar um aparelho perdido no velho satélite. O personagem então começa a pensar e refletir sobre como lutou para chegar até ali, sobre a sociedade como um todo, como somos marionetes para algumas pessoas e de como depois de realizarmos nossos sonhos somos simplificados pelas pessoas.
Um dos pontos fortes de Entrespaço é a arte. Quando o Astronauta se vê sozinho refletindo sobre a vida, Daniel usa bem o fator imensidão espacial para demonstrar como nesses momentos estamos sós. Vou dar um exemplo básico: quando você está na sua cama, antes de dormir e pensa na sua vida, naquela oportunidade que perdeu, no que deixou de fazer, ou aquela vitória que teve. É um momento solitário. É um momento em que você está em intimidade com seus pensamentos. Sozinho. Como se estivesse no espaço.
Eu conheci Entrespaço pelo Twitter (podem seguir o autor no @bomdiavermes )quando ainda estava sendo concebida pelo Daniel. O autor vira e mexe postava artes da HQ e era uma coisa mais linda do que a outra. Logo em seguida veio à campanha vitoriosa no Catarse e, finalmente, o grande lançamento durante o FIQ deste ano. Apoiei a campanha mas não tive como ir ao festival, e daqui de casa, lia os relatos de quem já tinha “consumido”Entrespaço. O que só aumentou minha expectativa. E depois que ela chegou, sim, eu me vi como o Astronauta.
A sua saga para chegar ao seu sonho de criança, com intensivos estudos, treinamentos regados a vômitos e giros em maquinas, até chegar no auge de finalmente ir para o espaço realizar uma missão de apenas 30 minutos. Pode se assemelhar ao que nos temos como sonho também. Quantas e quantas vezes você quer realizar algo, planeja, corre atrás, sofre, vence, pensa em desistir, levanta a cabeça, consegue e vence. Mas as pessoas ao seu redor simplesmente lançam um “não fez mais do que sua obrigação”. “Isso é besteira”. “Você deveria arrumar um trabalho de verdade”. “Olha, isso que você faz não é nada demais”. Banalizam o teu sonho. As suas conquistas.
O sonho do Astronauta era estar nas estrelas. Para isso ele dedicou uma vida de estudos e treinamentos. Para chegar finalmente e ir buscar uma peça que ficou perdida na Lua. O modo em que seus superiores tratam a missão que é o auge da vida do Astronauta é o que incomoda. Você chega no seu auge, e as pessoas vão sucateando sua vitória. Por isso a identificação com o personagem fica tão latente.
Mas, Entrespaço, também fala do ligar o f*da-se. Cara, você chegou no seu auge. Realizou o que mais queria. Chegou no resultado depois de tanto tempo de batalha. E aí? Vai deixar por isso mesmo? Vai deixar influências de fora diminuírem ou simplificarem o que foi conquistado? Tem que viver e valorizar o que alcançou. Tem que se orgulhar. Não ser arrogante, mas ser exemplo de quem lutou e conseguiu. O Astronauta não é uma pessoa cheia de si, daquela do tipo “só eu basta”. É um pensador contemporâneo. Que somente resolveu viver o que batalhou para a sua vida.
E você? Vai realizar o que quer para a sua vida? Vai deixar vozes de fora diminuírem o que você faz/fez?
Pense nisso.
Entrespaço tem formato 17 x 26 cm, 36 páginas em P&B com detalhes coloridos e ainda conta com (lindos) extras dos artistas Mario Cau, Eduardo Medeiros, João Pedro Chagas e Fabiano Lima. A HQ é a primeira publicação do Cavernna Comics, e você pode, e deve adquirir seu exemplar na loja online clicando AQUI.
Começou recentemente a campanha de financiamento coletivo no Catarse para a HQ Entrespaço de Daniel Sousa. O projeto é o debute solo do roteirista e desenhista nos quadrinhos e será lançado oficialmente no FIQ desse ano.
Entrespaço, que é baseada no conto O Homem do Espaço, narra a crônica de um astronauta que está em missão de recuperação na Lua. Mas apesar de ser um sci-fi, a trama reflete um período complicado vivido por Daniel alguns anos atrás. O projeto, que tem um teor particular, surgiu como um desabafo pessoal, algo que ele precisava colocar para fora.
A produção de Entrespaço durou três meses, com Daniel Sousa colocando as belas artes em suas redes sociais.
“Foram noites sem dormir. Devido à autocrítica, vergonha e aprendizado”, disse o autor. “Mas o mais importante é a pessoa que ler o quadrinho, vai ter algo que me deu um prazer imenso de fazer. Eu consegui entregar uma coisa que foi feito pelo puro prazer de contar histórias”.
Entrespaço tem formato 17 x 26 cm, 25 páginas em cores (mas com uma pegada mais forte no preto e branco)e ainda está sendo decidido se será em lombada quadrada ou grampo. Mas seja qual for, a decisão final, não vai influenciar no valor do projeto. A HQ será publicada de forma independente pela Cavernna Comics.
Para saber mais sobre o financiamento coletivo de Entrespaço, suas campanhas, suas recompensas e, claro, para apoiar, é só clicar AQUI.