Categorias
Detective Comics Quadrinhos

Kombi 95 te leva para um passeio pelos anos 90

“Anos 90. Regras: Não há regras.”

Durante os anos de 1963 e 2001 em São Paulo, circulou um dos maiores sucessos editoriais do país: o jornal Notícias Populares. Ou simplesmente NP. A publicação entrou para história com suas manchetes violentas e sexuais. Suas matérias faziam sucesso na época, e o NP tinha como slogan os dizeres “Nada mais que a verdade”. Foi dele que surgiram matérias como o Bebê Diabo, O Desaparecimento de Roberto Carlos e a Gangue dos Palhaços.

A Gangue dos Palhaços era um bando, que segundo o Notícias Populares, composto na verdade por duas pessoas, um homem negro e uma loira. Ele vestido de palhaço e ela de bailarina. Eles atraiam crianças com balas e doces, e depois jogavam dentro de uma Kombi branca. Depois a criança que tinha sido raptada era encontrada sem órgãos. Eles atuavam sempre na frente das escolas. Apesar do NP sempre deixar bem claro em suas páginas que não passavam de boatos, o caso teve grande repercussão ao nível nacional. Tendo até relatos de testemunhas da tal Kombi. Havendo caso de palhaços de verdade que foram espancados por engando pelo povo. Os anos se passaram e o caso virou lenda urbana em todos os lugares do Brasil, por exemplo, eu sou da cidade de São Gonçalo/RJ, e aqui a lenda tem bastante força, inspirando até uma banda de punk/rock que tem o nome de A Kombi Que Pega Crianças. Confira o som dos caras no jabá AQUI.

É a partir dessa lenda urbana, noticiado com exaustão por cerca de dois meses seguidos pelo Notícias Populares, que a HQ Kombi 95 vira a chave da ignição e pisa no acelerador. A mais nova publicação do selo Plot! que é um dos braços da Editora Alto Astral, é escrita e desenhada pelo Thiago Cruz, o popular Thiago Ossostortos (sobrenome adquirido graças ao seu blog Ossostortos.blogspot.com.br), assim como foi com Peek a Boo – A Masmorra dos Coalas da Psonha, confira a resenha AQUI,  do mesmo selo, a edição é bem colorida, com o acabamento bem feito e posso dizer que é um dos quadrinhos mais divertidos que li no ano. E Kombi 95 é uma grande homenagem a tudo que se refere aos anos 90.

E quando eu digo tudo, é TUDO mesmo.

Kombi 95 já começa de um jeito bem divertido que mostra, como a própria HQ diz: “Quando a rua era quintal”. A época que se andava na rua, brincava na rua, sentava-se nas calçadas para fofocar sobre o que acontecia na rua. A ode aos anos 90 que Thiago Ossostortos colocou nos remete a um momento onde as pessoas só tinham como interagir no tête-à-tête, sem telefones, computadores e afins. Isso sem contar nas DIVERSAS referências musicais, televisivas, de moda, tendências, comidas, comportamento dos jovens etc e tal. Logo de cara temos a grande referência, a capa da HQ é baseada no clássico disco do Green Day: Dookie (1994).

Mas vamos para a história, Kombi 95 começa com o sumiço do menino Albino, e o boato que ele tinha sido sequestrado pela Gangue dos Palhaços estava cada vez mais forte, seus amigos então resolvem investigar e montam uma força-tarefa chamada de Os Caça-Palhaços. Apesar dos meninos parecerem estar mais animados com a diversão que a investigação proporciona do que resolver o mistério mesmo. A partir daí a história se desenrola se misturando com elementos dos anos 90. Tais elementos são praticamente personagens da HQ, em momentos eles interagem com a história, e ao mesmo tempo parecem ser uma história a parte. Ao mesmo tempo em que nos afastam da trama principal eles nos trazem de volta. O desfecho de Kombi 95, confesso que foi algo que não esperava. E é bem legal quando uma reviravolta que você menos espera acontece do nada, algo meio raro nos quadrinhos de hoje em dia, principalmente em alguns casos gringos.

O modo que Thiago Ossostortos coloca de tudo um pouco nos desenhos é impressionante, e ao mesmo tempo não fica nada confuso visualmente. Em qualquer parte da HQ você encontra um pedaço dos anos 90. Coisas como a batalha dominical entre Gugu X Faustão pela audiência está lá, como também tem o simples fato de ter que usar todas as fotos do rolo para poder revelar fotos. Jogar videogame em locadoras, ir à banca de jornal para comprar figurinhas, algumas coisas são mais tradicionais de São Paulo como, por exemplo, a extinta loja Mappin. Mas mesmo que você não pegue tudo que está lá, ou simplesmente não venha conhecer, não atrapalha o desenvolvimento da trama.

As interações dos personagens com o modo de viver dos anos 90, não tem como sentir um pouco da nostalgia e saudades daquela época. Tanto nas amizades como nas paqueras. Rolando até um momento, digamos sublime, para todo o adolescente. Tudo que é referente à juventude daqueles anos está lá, algumas gírias, modo de vestir, skates, patins, bicicletas… sempre tinha um que o pai era melhor financeiramente e tinha uma mobilete. Ou mesmo um computador, que na época se resumia a jogar DOOM e outros jogos, um tempo em que a internet ainda começava a engatinhar. Acesso mesmo, que poucas pessoas tinham, somente depois de meia-noite, via telefone, com o ancestral barulhinho de conexão.

Mas o que dita fortemente são as músicas. Sim, podemos dizer que Kombi 95 tem a sua própria trilha sonora. As músicas se espalham no decorrer da história e tem até uma playlist para poder ouvir. Na HQ tem um QR CODE, onde pode ouvir a eclética setlist no Spotify recheada de sucessos dos anos 90. Raimundos, Mamonas Assassinas, Titãs, Leandro & Leonardo, Só Pra Contrariar, Chitãozinho & Xororó, Racionais MC’S entre outros fazem parte da lista de 13 músicas.

Kombi 95 diverte e entrega o que propõe com seu acabamento bonito e uma excelente produção. No final ainda rola alguns desenhos adicionais bem bacanas, e a contra-capa são com fotos do Notícias Populares. Mais um belo lançamento da Plot! que vale a pena ser conferido.

 

Categorias
Detective Comics Quadrinhos

Resenha | Peek a Boo – A Masmorra dos Coalas

Foi um dia duro. O trabalho tinha me consumido, final de mês, metas apertadas, clientes que ainda não tinham recebido seus produtos e um trânsito infernal. Chego em casa exaurido. Cansado. Em frangalhos. Ao desabar no sofá, troco meia dúzia de brincadeiras com minha filha de 1 ano, mas com a cabeça ainda a mil. Eis que minha esposa diz: “isso chegou para você pelo correio”, peguei o pacote e vi no remetente o nome do meu amigo Felipe Castilho da Editora Plot! o novo selo de quadrinhos da Alto Astral. Já falamos dela aqui na Torre de Vigilância. Abro o pacote e puxo Peek a Boo – A Masmorra dos Coalas. Tomo um banho e parto para a leitura. Melhor coisa do dia.

Ilustrado e idealizado pela quadrinista Psonha e com a contribuição de Thiago Ossostortos nos diálogos, logo conhecemos a carismática Mambay e sua fiel companheira Cassandra, a sua gata de estimação, que são praticamente “arrancadas” de casa para ir acampar com os pais sem noção. Uma vez no meio do mato, sem telefones, computadores e WI-FI a menina se perde e conhece Apolônio, um simpático vampiro que deixou de chupar sangue para se tornar um peixetariano. Então a dupla se mete em uma aventura com direito a coalas, garotinhos com chapéus de Napoleão, cogumelos pigmeus zumbis, vampiros obcecados por karaokê e um morcego que se chama Bruce. [Cole aqui o meme de referência do Capitão América].

Parece ser bem louco né? E pode ter certeza amado leitor, é bem louco. E é leve. Gostoso de ler. Um refresco para a mente (no caso da minha que estava cansada), e um bom recreio entre um quadrinho de super-heróis e outro. Apesar de ser uma loucura, não pesa a leitura e o teor meio que “descompromissado” ajuda no desenrolar da trama. A salada de cores que passa por azul, roxo, magenta, vermelho e um tom de verde para nos lembrar da floresta é bem aprazível aos olhos, ajudando na melhor concepção da história.

Em termo de história, Psonha usou e abusou de “viagens na maionese”. Em algum momento parece que estamos lendo/assistindo um episodio de A Hora da Aventura ou então Apenas um Show. Mas diferente de alguns casos, os absurdos apresentados durante a aventura de Mambay e Apolônio, não são forçados, eles simplesmente acontecem por que ali, naquela floresta, tinha que acontecer. Apesar de ser uma trama até que meio óbvia, são esses absurdos que ditam a batida da história. E eles funcionam muito bem.  E não se engane achando que o teor infantil é forte, longe disso, Peek a Boo agrada para todas as idades.

Os personagens são bem construídos. Impossível não olhar para a Mambay e não pensar em a criançada de hoje em dia, que vivem mais enfurnados nas tecnologias e acabam não sabendo muito sobre o mundo ao redor deles. Coisas simples como ver uma árvore dançando ao vento, estrelas e lua iluminando a noite, ou se socializarem pessoalmente com outras crianças. Coisas que estão ficando para trás. Saber lidar com outras pessoas, acreditando nelas de olhos fechados, é a maior lição de Peek a Boo. Mambay e Apolônio, cada um tem sua confusão pessoal com a sua família, e se completam e funcionam muito bem e o final fica o gostinho de quero mais.

Peek a Boo – A Masmorra dos Coalas é o cartão de visita da Editora Plot! e que belo começo. A edição tem o acabamento muito bonito, capa dura e algumas páginas mostram os primeiros esboços da produção. A Plot! chegou e mostrou que quer ficar no mercado cada vez mais concorrido dos quadrinhos nacionais. O próximo lançamento, que está acontecendo na Bienal do Livro do Rio, é Kombi 95 de Thiago Ossostortos. Que vai seguir o padrão de Peek a Boo, é sucesso garantido.