Já habitual referência nas histórias em quadrinhos europeias, René Magritte aterrissou nos quadrinhos brasileiros de forma surpreendente. O pintor surrealista já havia sido retratado recentemente por aqui em Óleo Sobre Tela, lançado em outubro de 2018 por Aline Zouvi e agora, pela Sesi-SP Editora, revela o então desconhecido Hugo Aguiar e um lado antes oculto de Gustavo Machado.
O barulho de um raio pode causar medo; Uma imagem pode causar medo; O pensamento no desconhecido pode causar medo. E bem aqui está a estratégia traçada pela história: A ausência total de texto, inclusive de onomatopeias. Palavras surgem apenas em uma conversa inicial e interlúdios.
O protagonista é justamente Magritte e seus conturbados pensamentos são a obra do horror nessa HQ. Seus quadros voltam contra si e sua vida e não há como escapar de seu cachimbo que não é cachimbo ao seu reflexo no espelho em outra perspectiva. A quantidade de referências é absurda e várias delas são inclusive difíceis de reconhecer logo de cara para quem não acompanha arte. Não que seja um problema, pois todas são explicadas ao fim da edição.
Já veterano, Machado se tornou conhecido no meio como ilustrador dos Quadrinhos Disney, Trapalhões e Turma do Arrepio, esta última um dos poucos registros populares em suas obras relacionadas ao terror, mesmo que para o público infanto-juvenil. Aqui, sua arte surpreende e muito. Seu traço é tão diferente nesta HQ que facilmente sua identidade poderia se passar por um heterônimo. É uma grata surpresa aos que se acostumaram ao seu traço mais alegre.
Surrealismo não é feito para entender, mas para sentir. De Magritte à Glauber Rocha, tentar explicar o inexplicável se torna uma armadilha. Cada um tira sua conclusão das obras dessa escola ao fim das contas.
A história é curta. Aconselhada para leituras rápidas, mas que renderá pesquisas muito maiores a quem se interessar pela obra do pintor à partir de então.