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Torre Lista #3 | Animês de 2021

O que seriam tradições se não a inércia te forçando a fazer algo simplesmente por sempre ter feito aquilo? A ideia de que precisamos fazer uma retrospectiva ao final de cada ano não é necessariamente verdade, e ano após ano, penso sobre a futilidade da existência e sobre a efemeridade da vida humana… Mas acabamos fazendo a lista de melhores animês do ano de qualquer forma!

2021 teve seus (poucos) altos e (vários) baixos, tanto num contexto geral, como para as animações japonesas. Embora falar mal de coisas dê ibope, preferimos comentar sobre o que o redator mais gostou ao longo das quatro temporadas, fazendo um top 10 dos shows que o leitor médio da Torre provavelmente não vai querer assistir.

Esse ano, teremos apenas eu (Vini) comentando sobre sua lista, mas, para compensar, tentei fazer uma postagem mais legal e engajada. Depois me digam se deu certo ou não, beleza? Sem mais delongas, segue:

Décimo lugar: "Tropical-Rouge Precure"

10. Tropical-Rouge Precure

Onde assistir: Crunchyroll
Leia mais: Um pouco de esperança com “Pretty Cure” (Tecnicamente sobre a temporada anterior, mas o sentimento ainda vale!)

Para abrir a lista, nada como garotas mágicas e sereias, não é mesmo?

Depois de uma temporada um pouco mais reflexiva e contida (que foi Healin’ Good Pretty Cure), Tropical-Rouge veio com tudo para uma temporada animada, pra cima e super agitada, uma atmosfera divertida que realmente fez falta no ano passado. Trazer o tema de “motivação” em um ano tão conturbado como 2021 foi um acerto da série, pois semana após semana, a alegria das protagonistas (em especial da Manatsu, dublada pela talentosíssima Ai Fairouz) era contagiante, te enchendo de sentimentos positivos para encarar a semana que chegava.

Além disso, por ser uma temporada mais “reativa”, onde as garotas apenas respondiam aos perigos apresentados pela Bruxa da Protelação e seus lacaios, tivemos muito tempo para ver o dia-a-dia e as aventuras “mundanas” das personagens. Isso deu espaço para bastante desenvolvimento de cada uma delas, além de diversas situações engraçadas e emocionantes ao longo do ano.

Para quem já conhece a franquia, “Tropical-Rouge” foi uma ótima temporada, potencialmente rivalizando com algumas das favoritas do fandom. E para quem não conhece, pode servir como uma excelente apresentação, por ser agitada o bastante para não se tornar chata.

Mas é claro que eu recomendaria, afinal, se não recomendasse, não estaria no meu Top 10, não é mesmo?


Nono lugar: "Combatants Will Be Dispatched!"

9. Combatants Will Be Dispatched!

Onde assistir: Funimation (Também disponível dublado!)

Claro que não seria uma lista minha se não estivesse repleta de comédias. “Combatants Will be Dispatched!” é apenas a primeira comédia pura a entrar aqui, mas mesmo estando em nono lugar, certamente não decepciona.

Sendo do mesmo autor de “KonoSuba!” (que eu já falei sobre antes), você deve saber exatamente o que está te esperando: Uma história exagerada, baseada em um humor com requintes de crueldade e perversão (no bom sentido! Eu acho).

A comparação com sua obra-irmã é inevitável. As duas são, na minha opinião, a mesma coisa com apresentações diferentes. Você prefere um belo bolo de morango ou uma charmosa torta de morango? Independente do que você escolher, o recheio será o mesmo. A ideia acaba sendo mais ou menos essa. “KonoSuba!” é uma obra intrinsecamente mágica e medieval, enquanto “Combatants” se passa num mundo com conceitos modernos e tecnológicos… Mas no final, os dois se baseiam no mesmo tipo de humor e possuem elencos semelhantes.

Na prática, o que quero dizer é que se você gostou de “KonoSuba!”, você vai gostar de “Combatants Will be Dispatched!”, e vice-versa. Agora, se não gostou… Bem, a lista só está começando! Segue dando scroll aí, que ainda tem muitos shows de 2021 para ver.


Oitavo lugar: "The Saint's Magic Power is Omnipotent"

8. The Saint’s Magic Power is Omnipotent

Onde assistir: Funimation (Também disponível dublado!)
Leia mais: Buscando uma vida tranquila em outro mundo

Procurando uma história séria, mas que ainda seja leve e divertida? Cansado de animês sobre adolescentes, e queria um elenco de adultos, pensando e agindo como adultos? Adora quando personagens fazem carinhas caricatas super engraçadas? Se respondeu “sim” para ao menos uma dessas perguntas, talvez você devesse dar uma chance para nossa Santa Sei.

Eu sei que é um isekai, e eu sei que é uma história com elementos mágicos super fantasiosos… Mas é um show tão gratificante de se acompanhar, que até mesmo quem não vai bem com esses elementos pode acabar gostando. A jornada da protagonista, Sei, de tentar conseguir viver a vida tranquila que nunca pôde ter no mundo real, é muito fácil de se identificar com, e cada desenvolvimento é retratado por uma ótica tão pé-no-chão e realista que você se sente no lugar dela muito facilmente.

Embora não seja uma comédia, tem sua boa dose de humor, e seu clima leve é ideal para relaxar depois de um dia cansativo de trabalho.


Sétimo lugar: Animê "The Case Study of Vanitas"

7. The Case Study of Vanitas

Onde assistir: Funimation e, a partir de algum dia de janeiro, também na Crunchyroll (Também disponível dublado!)

Agora que coloquei os dois lado a lado na lista, “The Case Study of Vanitas” e “The Saint’s Magic Power is Omnipotent” tem uma vibe bem similar… Claro, são animês completamente diferentes, com públicos diferentes e ideias diferentes, mas ambos passam a mesma impressão de uma história séria, mas nem tanto; com humor no tempo certo e muitas carinhas caricatas; um elenco majoritariamente de adultos e que na maioria das vezes tem noção do que estão fazendo… É, dá pra enganar um ou outro com isso.

Vanitas” é, claro, uma obra de arte visual. Um show sobre vampiros, situado em uma hipotética Paris do século XIX? Seria incrível fazer algo que não fosse extremamente bonito e elaborado. Mas a obra se apoia em sua beleza técnica sem usá-la como bengala. Suas personagens são intrigantes e falhas, dando a elas uma sensação de realidade, de humanidade (até mesmo para os vampiros); e sua história está sempre se movendo, sempre indo numa direção que você não espera, e te deixando com vontade de saber mais e mais sobre aquele mundo.

E se “Vampiros sexy lutando em batalhas super coreografadas e com uma história incrivelmente interessante” não for o suficiente pra te convencer, você pode se interessar ao saber que Noè, um dos protagonistas, possui um gato gordinho e preguiçoso super fofo ain que coisa mais fofinha… Ou, se interessar em tentar cancelar Vanitas, o outro protagonista, que faz algo politicamente incorreto quase que diariamente.

São opções válidas de entretenimento em 2021.

Ah, sim, e a segunda temporada vai começar agora em Janeiro, então é um ótimo momento para você ficar em dia e acompanhar semanalmente os novos episódios.


Sexto lugar de 2021: Animê "The Aquatope on White Sand"

6. The Aquatope on White Sand

Onde assistir: Crunchyroll
Leia mais: “The Aquatope on White Sand” e o pecado de amar demais

A postagem sobre “Aquatope” saiu há pouco, e por causa disso, eu honestamente não tenho muito mais para dizer sobre o animê. Dá uma olhada no link ali em cima.

Em resumo, o último animê “sério” da lista é uma história passageira sobre magia e realismo. Outra super-produção técnica da P.A. Works, e se você conhece esse nome, já deve ser mais que o suficiente. E se não conhece, eu expliquei na postagem ali em cima. Vai lá ver.

Apenas um comentário engraçado e parcialmente fora do assunto: Vi pessoas comentando que “Aquatope” passa uma impressão de ser “muito yuri”. Acho que é uma questão de referência, né? Eu, particularmente, diria que está bem longe de ser ou ser sugestivo, mas até entendo que pessoas não muito acostumadas com o gênero “Yuri/GL” possam ter essa impressão. Enfim, só trazendo essa experiência para deixar esse tópico um pouco maior.


Quinto lugar de 2021: Animê "Osamake: Romcom Where The Childhood Friend Won't Lose"

5. Osamake: Romcom Where The Childhood Friend Won’t Lose

Onde assistir: Crunchyroll

Para começar a sequência de comédias que vai fechar a lista (sim, é tudo comédia daqui pra baixo), acho razoável voltar às minhas origens e colocar uma comédia-romântica baseada em uma Light Novel com título imenso e que serve de sinopse para a obra.

Osamake” é uma péssima adaptação para uma péssima história. Isso precisa ser dito logo de cara para alinharmos nossas expectativas. Acontece que até mesmo um carro desgovernado e em chamas pode servir para algo, e esse animê é um exemplo claro disso: Nem tudo precisa ser levado a sério; Nem tudo precisa ser tecnicamente perfeito; Nem tudo precisa fazer sentido ou ser coeso ou simplesmente ter sido pensado por mais de três segundos antes de ser colocado no papel. E tudo bem. “Osamake” é uma comédia absurda, mas não de propósito. Ela é absurda por todos os problemas que ela tem, de forma que a coisa fica ironicamente boa.

O clássico “desligue o cérebro e aproveite a calcinação mental”, sabe? Pois o que eu me diverti com esse animê não está escrito, mesmo sabendo que é uma das piores coisas que eu já consumi, tanto em 2021, como na vida. Adoraria ver mais, e você talvez também adore. Dá uma chance pro coitado.


Quarto lugar de 2021: Animê "The Quintessential Quintuplets 2"

4. The Quintessential Quintuplets 2

Onde assistir: Crunchyroll
Leia mais: O destino de comédias-românticas com “As Quíntuplas”

Única continuação da lista, e está numa posição bem alta, ein! Bem, se considerar que a primeira temporada tinha ficado em 1º lugar no seu ano de lançamento, 4º lugar é até que uma queda considerável. E acho que isso reflete bem o que houve com a série.

Como comentei na postagem, “As Quíntuplas” é uma das minhas comédias-românticas prediletas. Essa nova temporada pode ter sido um pouco menos engraçada que a primeira, por conta da carga de drama obrigatória, mas ainda se manteve muito bem, e mesmo com essa leve queda, ainda ficou melhor que muita coisa. A mudança de estúdio, a adição de novos personagens secundários, o avanço no relacionamento das personagens e, especialmente, a dedicação em manter a comédia mesmo no meio do drama, foram pontos que renderam o quarto lugar do ano à essa série que vai ser finalizada em um filme…

Ah, como eu odeio filmes que dão continuidade a séries…


Terceiro Lugar de 2021: Animê "The Vampire Dies in no Time"

3. The Vampire Dies in No Time

Onde assistir: Funimation (Também disponível dublado!)

Falar de “The Vampire Dies in no Time” vai ser complicado. Eu gostei tanto do animê que eu queria ter feito uma postagem só para ele, falando sobre suas qualidades e o quão divertido ele é. Mas eu não consegui. Estamos falando de uma comédia clássica, que funciona na base do grito e do absurdo. E eles são muito bons nisso. Acontece que… Como podemos falar sobre gritos e absurdos? Eles só fazem sentido em contexto, e é justamente o contexto que faz a graça do show.

Talvez o mais legal é que a parte técnica do show foi utilizada muito bem, fazendo piadas visuais que complementam a conversa, e uma direção de áudio que só perde para o próximo da lista. Fora que né, botar Jun Fukuyama e Makoto Furukawa para gritar entre si por três meses é uma decisão genial.

Prêmio de melhor abertura e de melhor mascote de 2021 vão para “The Vampire Dies in No Time”, também. Abraços para o John!


Segunda lugar de 2021: Animê "Girlfriend Girlfriend"

2. Girlfriend Girlfriend

Onde assistir: Crunchyroll
Leia mais: Primeiras Impressões | Girlfriend Girlfriend

Se você entendeu a dica que eu dei no item anterior, teria certeza de que o segundo colocado da lista só poderia ser “Girlfriend Girlfriend”.

A postagem que temos sobre o show é uma de “Primeiras Impressões”, onde eu escrevi tendo visto apenas dois episódios do animê. Relendo o que eu disse lá, não tenho muito o que acrescentar, pois a qualidade, a graça e a falta de bom senso que eu tanto elogiei no começo, se mantiveram até o fim.

Inclusive, minha nossa, eu fiquei muito feliz que a história se manteve boba e sem se levar a sério por toda a duração do que foi adaptado. Seguimos os doze episódios com o mais puro suco de Manzai, com música, efeitos sonoros e dublagem que deixavam tudo dez vezes melhor (ou pior, mas nesse caso, são termos equivalentes).

Os avisos de antes se mantém, porém: Estamos em 2021! Você precisa esquecer qualquer coisa e simplesmente assistir o show pelo que ele tenta ser. Não tente racionalizar ou questionar a situação, pois o próprio animê não tenta. Estamos aqui para dar risada de uma situação hipotética, e eles fazem isso muito bem!


Primeiro lugar de 2021: Animê "I've been killing slimes for 300 years and maxed out my level"

1. I’ve Been Killing Slimes for 300 Years and Maxed Out My Level

Onde assistir: Crunchyroll (Também disponível dublado!)
Leia mais: Buscando uma vida tranquila em outro mundo

E chegamos ao grande campeão, o animê que eu julguei como sendo o melhor do ano de 2021. Aquele que eu mais gostei, que mais me marcou, e que eu lembrarei por mais tempo: Fiquei matando gosmas por trezentos anos e cheguei no nível máximo.

Não há uma única coisa ruim que eu possa falar sobre “Killing Slimes”. Não existe um único defeito. Literalmente perfeito do início ao fim. Eu me diverti em todos os episódios, tanto com o humor que me fez dar gostosas risadas, como com todo o clima positivo e alegre que a Azusa e família proporcionam.

E já que citei, acho legal comentar sobre o episódio 10, que foi o momento onde eu decidi de vez que esse seria o meu animê predileto do ano. Não estou exagerando nem um pouco quando digo que é possivelmente um dos melhores episódios individuais de animação que eu já assisti, tanto em 2021, como na minha vida. É um arco de desenvolvimento de personagem completo e emocionante em meros 24 minutos.

Aplaudo de pé.


Menção Honrosa: Animê "Vlad Love" (Não é de 2021, mas...)

Menção Honrosa: Vlad Love

Onde assistir: Crunchyroll
Leia mais: Vlad Love é uma declaração de amor ao caos

Eu precisava roubar um pouquinho, desculpa.

Tecnicamente falando, “Vlad Love” teve seu primeiro episódio lançado em 18 de dezembro de 2020, fazendo com que ele não seja, de fato, um “animê de 2021”… Mas com quase todo o resto tendo saído em 2021, eu acho válido pelo menos citá-lo nesta lista, especialmente por tudo que ele fez.

Mamoru Oshii é um nome que carrega muitos significados, que variam de pessoa para pessoa. Para mim, ele representa o ápice da comédia absurda e do anti-humor. “Vlad Love” foi a maior declaração de amor ao gênero que o diretor poderia fazer, e eu respeito essa paixão com essa dedicatória.


Muitos bons títulos ficaram de fora da lista, seja pela competição acirrada, ou seja por eu não ter tido tempo o suficiente para assistir tudo que eu queria (Prometo que vou assistir ODDTAXI algum dia). Mas acho que, no geral, os onze animês citados mostram um excelente cenário e uma ótima seleção de comédias – com algumas coisas sérias no meio.

E você? Qual foi o seu animê predileto de 2021? Concorda com a opinião do nosso redator? Ajude com o engajamento das redes sociais e comente sobre o quão certo ou quão errado eu estou, e fiquem ligados para mais conteúdo no ano que chega amanhã!

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“The Aquatope on White Sand” e o pecado de amar demais

Procurando um animê para toda a família? Algo que poderia muito bem passar na Sessão da Tarde, irritar o seu tio, fazer sua mãe chorar, e seu primo que é redator de um blog de cultura nerd reclamar sobre escolhas de roteiro que ele entende que não são feitas para um público-alvo como ele? Pois “The Aquatope on White Sand” é possivelmente o show para você!

Captura de tela do episódio 18 de "The Aquatope on White Sand", mostrando Kukuru entregando bonecos para várias crianças
“Essa garotada vai se meter em altas confusões enquanto se aventuram no incrível mundo dos aquários!” (Reprodução: Crunchyroll)

Antes de começarmos, porém, vai ser necessário entender com quem estamos lidando. “Aquatope” é mais um animê original da P.A. Works, estúdio conhecido por criar lindos cenários e histórias que destacam o comum como mágico e a magia como corriqueira. A direção é de Toshiya Shinohara, que também fez coisa parecida em “IRODUKU: The World in Colors”, e “Nagi-Asu: A Lull in the Sea”.

Isso faz com que um novo animê vindo deles tenha uma certa expectativa, de seguir a “fórmula P.A. Works”: Uma trama adolescente que tica todas as caixas na lista de “coming-of-age” da Wikipédia; uma parte técnica linda e que vai agradar todos os nerds das respectivas áreas; e a garantia de um sucesso cult entre os que não gostam tanto assim de mecha dos anos 70. E “Aquatope” é exatamente isso, surpreendendo por o quão nos eixos ele conseguiu seguir semana após semana.

Abaixo, a sinopse e o trailer do show, que estreou em julho deste ano e terminou sua exibição recentemente, conforme fornecidos pela Crunchyroll:

“Em um pequeno aquário localizado na ilha de Okinawa, trabalha Kukuru Misakino, uma jovem de 18 anos. Lá ela encontra Fuka Miyazawa, uma ex-idol que perdeu seu emprego em Tóquio e está desnorteada. Elas começam a passar os dias juntas no aquário, conhecendo melhor uma a outra, mesmo com a iminente crise financeira ameaçando fechar o estabelecimento. Em meio aos sonhos e à realidade, à solidão e à amizade, aos laços e aos conflitos, as duas amigas vão virar uma nova e brilhante página neste verão.”

O contraste entre a primeira e a segunda parte da história é um dos pontos mais interessantes de se assistir pelo simples ato de compará-los. Começamos com uma adolescência mágica e inocente, onde tudo se resume a uma única coisa em um pequeno espaço. A jovem Kukuru é um retrato do próprio Aquário Gama Gama: enraizado a um alicerce instável, mas que sobrevive com base na boa vontade e no apoio de diversas mãos amigas. É um lugar intrinsecamente sobrenatural, que consegue mostrar a magia que só existe nos olhos de alguém naquela faixa etária.

Então, na segunda metade, a vida adulta mostra como o mundo é muito maior – e mais cruel – do que um conto-de-fadas teen. A magia se esvai conforme o chamado das responsabilidades se sobressai a qualquer oportunidade de sonhar. O Aquário Tingaara pode ser maior, mais tecnológico e possuir muito mais espécies, mas ele não passa de uma casca vazia para quem não entende a função daquele lugar, ou para quem o vê como um substituto de algo insubstituível.

O próprio conceito de histórias coming-of-age é mostrar que, na vida adulta, você precisa correr atrás de criar a sua própria magia. Buscar satisfação pessoal – seja com seu trabalho, hobbies, amizades ou amor – é a mensagem que o gênero tenta passar, e que “Aquatope” tentou contar de forma tão agridoce.

Captura de tela do episódio 1 de "The Aquatope on White Sand", mostrando Fuuka no oceano
Não tente prender a respiração durante as cenas aquáticas desse animê! Eles respiram com magia, você não! (Reprodução: Crunchyroll)

Um dos comentários que eu mais fiz (e que mais vi sendo feito por outras pessoas) durante a exibição do animê foi o realismo com que ele retratou os ambientes de trabalho. Em uma empresa pequena e familiar, foi mostrada a contratação de parentes e amigos, mesmo que sem experiência ou qualificação para o cargo; e uma hierarquia nada meritocrática onde a garota de 18 anos consegue se tornar chefe simplesmente por ser neta do dono. Já na empresa da “cidade grande”, o que vemos é uma relação nada saudável entre funcionários; uma equipe de marketing que não se importa nem um pouco com a equipe técnica e que simplesmente joga a bucha para eles e sai andando; estagiários desinteressados e que estão vendo o circo pegar fogo e simplesmente vão embora 17h em ponto… São pequenos toques de coisas que vemos no dia-a-dia que dá credibilidade para o slice of life do show.

Outro ponto desse realismo contextual é sobre como a história se foca nas suas protagonistas, mas sem deixar de mostrar que o mundo ao redor delas é orgânico e que coisas estão acontecendo mesmo longe de seus olhos. Ao longo de todo o animê, vemos situações sendo comentadas, ouvimos boatos sobre acontecimentos relevantes de personagens secundários, histórias que parecem ser extremamente interessantes, mas que nunca são contadas. Como acompanhamos a jornada da Kukuru e da Fuuka, o roteiro apenas explicita o que tem contato direto com o desenvolvimento das duas. Pode ser frustrante para quem tinha interesse nesses arcos que aconteceram fora da tela, mas é uma escolha proposital para destacar ainda mais que, na vida real, você apenas se importa com o seu pequeno círculo, e raramente se envolve em problemas alheios.

Captura de tela do episódio 18 de "The Aquatope on White Sand", mostrando Fuuka, com a legenda: "Acho que o mais incomum é gente como você, que escolhe trabalhar porque gosta."
O animê não só mostra como o trabalho funciona, como entende o principal ponto sobre trabalhar: Que ninguém gosta de trabalhar (Reprodução: Crunchyroll)

Agora, um problema que todos deveriam se envolver, é o tema que pairou sobre toda a história do animê: A conscientização ecológica e ambiental. Estamos assistindo um show sobre criaturas marinhas, com um roteiro que se baseia nos oceanos. É óbvio que teríamos ao menos uma mensagem sobre isso, né?

Se me perguntar, acho até que abordaram pouco o assunto! Ele foi bem suave, quase invisível, mas presente, durante 90% da duração do animê, e só decidiram deixá-lo mais descarado na parte final. Sei que sou suspeito ao falar isso, por ser ambientalista de formação, mas acho que informar e interessar as pessoas em questões ambientais deveria ser feito com maior frequência. Se botar garotas fictícias para sofrer semanalmente por seis meses é o que vai ajudar a fazer a nova geração se importar com o destino do planeta, que façam mais histórias tristes!

Captura de tela do episódio 22 de "The Aquatope on White Sand", mostrando uma tartaruga marinha e um amontoado de lixo, com a legenda "Mês passado, a maré trouxe uma tartaruga enrolada em cordas"
União sinistra P.A. Works e Projeto TAMAR (Reprodução: Crunchyroll)

Sei que acabei de falar no parágrafo anterior sobre como as garotas sofrem e como a história é triste… Mas a verdade é que “Aquatope”, em sua essência, não é uma tragédia. O que nós temos é uma série de pequenos problemas, uma morte por mil cortes. Claro que alguns cortes são maiores e mais profundos que outros, mas todos eles acontecem não pela existência de um vilão, uma figura malvada ou um desastre inimaginável. Eles acontecem pelo excesso de amor das personagens, e é aí que a piada do título se torna real. O único erro das protagonistas é amar demais, se apegar demais, ter empatia demais.

Cada drama, na verdade, não passa de uma simples dificuldade corriqueira. Para alguém que não se importa, seria uma mera inconveniência. Mas, para quem é apaixonado por aquilo, a coisa se torna uma questão de vida ou morte. Vemos diversos tipos de dificuldades se tornando trabalhos hercúleos por motivos diferentes, mas todos relacionados ao amor: A dificuldade de espalhar o seu amor para outros; a dificuldade de se recuperar de um amor perdido; a dificuldade em encontrar seu amor… O show faz um excelente trabalho de mostrar cada personagem sofrendo por um motivo diferente, te permitindo entender o quanto cada um ama o que está perdendo (ou lutando por).

Captura de tela do episódio 23, mostrando Kukuru cercada por três pinguins
Acho que “lutar pelos pinguins fofinhos ownn cuticuti” é o drama mais fácil de se identificar que o show oferece (Reprodução: Crunchyroll)

A mensagem final que o animê deixa é que a vida continua, você olhando para ela ou não. O que assistimos nos vinte e quatro episódios é apenas um pedaço da vida das personagens: Elas viveram coisas antes, muita coisa que não vimos aconteceu no durante, e elas continuarão vivendo depois. A história de “Aquatopetem um começo, um ponto onde as coisas mudam drasticamente… Mas ela não tem um fim. Encerramos um capítulo e uma nova página se abre, mas essa ainda está em branco. E fica claro que cada uma das personagens tem em mãos a tinta para escrever o seu próprio futuro.

The Aquatope on White Sand” é perfeito para quem gosta de recortes de uma vida incomum e mágica, mas racional e realista, e quer ver o crescimento de uma garota cujo único pecado foi amar demais. Divertido e complexo, engraçado e trágico, com contrastes na medida certa e pontos o suficiente em aberto para te deixar curioso ou irritado, depende do seu ponto de vista. Como um todo, a nota do redator é 4,0/5,0 e mais um adendo de que eu me esforcei para não colocar uma comparação entre o animê e um pagode no final do churrasco, pois ambos são bem parecidos.

Você pode assistir “The Aquatope on White Sand” na plataforma de streaming Crunchyroll, onde o animê está completo com 24 episódios e possui legendas em português.